No Cairo, enquanto o antigo Presidente do Egito agoniza e os candidatos rivais à presidência reclamavam ambos vitória, o "Conselho Supremo das Forças Armadas", por via do "Tribunal Constitucional", dissolveu o parlamento recentemente eleito, onde o partido da "Irmandade Muçulmana" detinha uma confortável maioria, e os militares retomaram as rédeas do poder assumindo poderes legislativos e constituintes. As manifestações estão de volta à Praça Tahrir para denunciar o que qualificam como um "golpe de estado", a traição à revolução e o desprezo dos militares pela democracia. A promessa de devolução do poder aos civis até ao final de junho é acolhida com grande ceticismo. Sobre a Líbia, desde as cenas de horror do assassínio do ditador deposto, desceu um silêncio cúmplice. Cerca de 400 grupos armados - "as "milícias" - instauraram o caos e a violência, na falta de autoridades policiais ou militares capazes de garantir a ordem, num estado que desconhece instituições administrativas ou serviços públicos. O país enfrenta ameaças de desagregação, os cofres de estado estão a saque, o lixo continua a acumular-se nas ruas e tarda a realização de eleições que permitam transferir para um governo democrático os poderes de um "Conselho Nacional de Transição" impotente e desacreditado. Na Síria, continua o massacre da população. Evitando qualquer referência ao destino do Presidente sírio Bashar al-Assad, Barak Obama e Wladimir Putin apelaram à "cessação imediata da violência" e manifestaram apoio aos esforços que estão a ser desenvolvidos por Kofi Annan, enviado especial conjunto das Nações Unidas e dos estados árabes, designadamente, quanto à necessidade de impulsionar a transição política para uma democracia pluralista, no respeito pela soberania e a integridade territorial da Síria. De facto, a intervenção desastrada da Nato no conflito da Líbia não facilita a obtenção dos consensos indispensáveis ao lançamento de uma intervenção internacional musculada no Médio Oriente. Olhando para o Egito e a Líbia, porém, não parece que o destino final dos ditadores depostos seja assim tão relevante para os destinos dos povos. Se uma transição negociada for o caminho certo para travar esta chacina, a "clemência" para com o Presidente sírio pode representar um preço compensador.
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Na Grécia, a "Nova Democracia", antigo partido da oposição de Direita às medidas de austeridade do antigo governo de Esquerda, prepara a formação de novo governo, em coligação com o adversário derrotado - os socialistas do Pasok - e com o Partido da Esquerda Democrática - dissidente do Syrisa, partido que conquistou o segundo lugar nas últimas eleições. Veremos agora se se justifica o alívio com que foi recebida nas mais altas instâncias da União Europeia a magra vitória da "Nova Democracia" - agraciada com o generoso bónus de 50 deputados que a Constituição grega concede aos vencedores. Entretanto, a Itália paga juros cada vez mais elevados nos mercados financeiros internacionais embora um pouco menos do que paga a Espanha que, pela mão do novo governo, caminha a contragosto para novos resgates, depois de ter conseguido resgatar a sua banca falida. Com tantas más notícias, a Irlanda e Portugal experimentam um alívio temporário. O chamado G20 - paliativo perverso inventado pelos mais fortes para disfarçar o crónico adiamento da reforma das Nações Unidas - reuniu no México. O grupo dos 20 mais ricos países do Mundo acordou sobre a conveniência do reforço urgente da integração fiscal da União Europeia. No Reino Unido, o comediante Jimmy Carr pedia desculpas públicas por se ter envolvido num esquema de evasão fiscal "legal mas moralmente condenável". Por cá, o Ministro Relvas pode dormir descansado porque "não praticou nenhum ilícito"! Miguel Cadilhe propõe um imposto sobre a riqueza: uma ousadia que se saúda, uma verdadeira "reforma estrutural" para este país dilacerado pelo fosso crescente entre ricos e pobres e por uma cultura política egoísta e mesquinha.