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A anunciada decisão de algumas televisões de virem a evitar, no futuro, debates com comentadores abertamente vinculados a emblemas clubistas pode ser uma excelente notícia. Prouvera que a conversa sobre futebol, que polui o nosso panorama televisivo, venha a ganhar alguma dignidade com essa depuração, já que a sua redução drástica não parece, infelizmente, estar nas cartas.
Muita da crispação que hoje marca o ambiente futebolístico nacional releva de alguns incendiários da palavra, que excitam o sectarismo, garantindo a pés juntos que "foi penálti", mas apenas quando tal corresponde aos interesses do seu clube e, claro, nada disso tendo a ver com a verdade objetiva dos factos, que é o que menos lhes importa.
As nossas televisões, à cata desesperada de audiências, enchem, por horas, esse circo de polémica, que é relativamente barato de sustentar e se sabe ter um mundo ululante de seguidores. Com mais ou menos adjetivos e decibéis, todos os canais televisivos seguem o mesmo caminho, mesmo aqueles que, pagos por todos nós, tinham obrigação de evitar esses vícios, assumindo a função pedagógica que o serviço público lhes deveria impor. Projetar verdades relativas, opiniões sobre factos que se sabe apenas motivadas por clubismo, às vezes com cartilhas de apoio, é um péssimo serviço prestado à educação cívica. A alguns média deveria ser a deontologia a impor essa obrigação, outros têm-na mesmo na sua natureza.
Mas fica-se por aqui esse mundo de trincheiras, a preto e branco, de factos relativos? Não fica. A política é também pasto para esse ambiente sectário, que sai das telas para se projetar nos jornais e, também, um pouco nas rádios.
Não conheço - mas admito poder estar enganado, se alguém mo provar - nenhuma democracia em que figuras eleitas ou dirigentes partidários disponham de colunas ou de outros espaços privativos de expressão mediática, com caráter regular, em órgãos de comunicação social, salvo naqueles que são, abertamente, folhas de propaganda das formações a que pertencem.
Por cá, contudo, há personalidades na política ativa que alimentam verdadeiros "tempos de antena" - nos jornais, rádios ou televisões. O que se pode esperar de alguém que foi eleito por uma certa cor, cujo futuro depende, em muito, da formação a que pertencem? Que critiquem os seus partidos? Multiplicando os atores, os média absolvem-se de acusação de sectarismo e alimentam a cacofonia, enchendo assim as horas e as páginas.
Isto já não muda, dizem alguns. São capazes de ter razão.
*Embaixador