Esta semana o país voltou a viver num reality show judicial. Horas de cobertura mediática e debates sobre a detenção de Bruno de Carvalho relativa ao ataque aos jogadores do Sporting na Academia de Alcochete.
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O país ficou entretido a participar, ou assistir, a elaboradas discussões jurídicas sobre as regras e condições da detenção, probabilidade de prisão preventiva, qualificação dos atos como terrorismo etc. Não me surpreende esta mediatização da justiça. Entristece-me, no entanto, o descuido com que muitas destas discussões têm lugar e choca-me o contraste entre o à-vontade com que se fazem juízos jurídicos e se recusam avaliações éticas, morais ou políticas. Devia ser o exato contrário. Não sei se Bruno de Carvalho é ou não responsável dos crimes que o MP lhe atribui. Mas critiquei duramente o seu comportamento enquanto presidente do Sporting. Não sabia, nem sei, se tem responsabilidade direta no ataque aos jogadores, mas sei, e disse-o, que a forma como os tratava não era eticamente aceitável. Também não hesitei em alertar para a sua clara violação de regras democráticas e da separação de poderes no Sporting.
Eis o que eu gostaria: que o país investisse uma pequena parte da energia que gasta a discutir a dimensão legal destes temas na sua avaliação e discussão ética, moral e política. Da mesma forma que já era possível fazer um juízo sobre as ações de Bruno de Carvalho antes da sua judicialização, o que sabemos, por exemplo, sobre os e-mails do Benfica ou a Operação Marquês já nos permite fazer uma avaliação ética, independente da avaliação jurídica, em relação ao que se passou nesses casos. Mas são poucos os que têm essa coragem. A judicialização destes temas parece servir de pretexto a impedir a sua avaliação ética, moral ou política. Invoca-se hoje a existência de uma investigação judicial para impedir qualquer outro escrutínio público. Qualquer juízo fica suspenso até os tribunais se pronunciarem... Aparentemente, na política e no desporto, os tribunais não servem apenas para apurar o que é legal ou ilegal, mas sim o que está certo ou errado... O preço que pagamos não está apenas na pouca responsabilização que daqui resulta. Sem discutirmos a dimensão ética, moral e política destes temas, independentemente da sua avaliação jurídica, não conseguiremos adotar as reformas necessárias para ter uma política e futebol mais decentes e sérios.
Professor universitário