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Depois de o debate entre projetos e protagonistas ter sido substituído por uma espécie de acordo tático entre "fações", o PS-Porto assinalou mais um Congresso Distrital em clima morno, sem grande novidade.
Na falta de uma grande ideia mobilizadora para o Porto e para o Norte, retêm-se como principais marcas de discurso: a afirmação do Norte no país e os objetivos de conquista da presidência da Área Metropolitana do Porto (uma vez instituída a eleição direta há muito defendida pelo PS) e da maioria das câmaras municipais, pelo Partido Socialista.
Proclamações dentro do expectável, mas que não podem deixar de merecer alguns avisos à tripulação no que concerne à meta assumida para as próximas eleições autárquicas.
A conquista da maioria das câmaras municipais, afirmada desta forma, é um objetivo absolutamente razoável para um partido como o PS.
Contudo, é preciso ter bem presente que a realidade não comporta cortes temporais e que o que se irá passar no outono de 2017 será fortemente condicionado pelas opções feitas nos últimos anos. Sendo certo que o caminho que se decidir seguir na cidade do Porto terá um peso que não se pode negligenciar na aferição política desse momento eleitoral.
Sobre o futuro do Porto, Manuel Pizarro já veio a público assumir que não será (re)candidato à Câmara, deixando no ar a possibilidade de o Partido Socialista apoiar Rui Moreira. Sem hesitações, Assunção Cristas aproveitou o Congresso do CDS-PP para anunciar o apoio do seu partido ao movimento que governa os destinos do Porto.
Como é óbvio, a palavra de Rui Moreira será determinante em tudo o que vier a acontecer e, após ter anunciado que voltará a candidatar-se à Presidência da Câmara do Porto, reagiu à manifestação de apoio do CDS/PP, pela voz do seu adjunto - não sei se este pormenor tem algum significado digno de leitura -, dizendo que não será candidato por nenhum dos partidos que o apoiam. E foi mais longe, ao transmitir que será candidato independente e aceitará o apoio de todos os partidos que o queiram fazer sem que isso condicione em nada o seu programa.
Chegados aqui, devo dizer que vejo com muita dificuldade um apoio do PS, nas eleições autárquicas, ao movimento independente que lidera a Câmara do Porto.
O PS é um partido estruturante na democracia portuguesa, com uma matriz ideológica definida e enquadradora da sua intervenção nos diversos patamares da ação política. Renunciar a isso, para apoiar uma candidatura independente que afirma, com sobranceria, que não aceitará condicionar em nada o seu programa de modo a alargar a sua abrangência, implicaria abrir mão da sua identidade e do seu espaço político de uma forma absolutamente inaceitável. Incorrendo numa opção com consequências imprevisíveis em termos do que é a sua implantação política na cidade, com impactos ao nível da região e do país.
Ninguém entenderia se, nestas circunstâncias, o Partido Socialista abdicasse de ter uma candidatura com programa próprio à Câmara do Porto!
O presidente da Federação Distrital do PS-Porto, agora eleito, e o presidente da Comissão Política Concelhia prometeram a realização de um referendo, entre os militantes, para determinar o rumo a seguir nas próximas autárquicas. Entendo que, face aos acontecimentos, nem sequer há necessidade de tal consulta, mas se, ainda assim, o quiserem fazer, é bom que tomem a iniciativa com a maior brevidade de modo a que os militantes possam ter uma real e efetiva possibilidade de escolha e não sejam colocados diante de uma qualquer inevitabilidade gerada pelo passar do tempo.
Entretanto, talvez seja interessante que, antes de qualquer debate sobre este assunto, se reflita sobre o que é que esta geração pós-Fernando Gomes, que agora se consolida em posições liderantes, tem para dar ao PS e ao Porto.
Tomo como boa a afirmação de que "a política sem risco é uma chatice"e acrescento que sem ideias é um deserto.
* Deputada pelo PS à Assembleia da República