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Em 2021 apenas 29 mulheres conquistaram a liderança de câmaras municipais. O número total caiu, em relação às autárquicas anteriores, e a transformação desde as primeiras eleições livres (com apenas cinco presidentes eleitas) tem sido muito mais lenta do que noutros setores da política. As quotas contribuem muito pouco para a paridade nos órgãos autárquicos.
Luísa Salgueiro, primeira mulher a presidir à Associação Nacional de Municípios Portugueses, afirmou em junho passado que as próprias mulheres, quando confrontadas com a possibilidade de ocupar o poder, passam a vez. Haverá muitas razões para isso, da difícil conciliação da vida familiar com a profissional aos estereótipos associados à liderança. Diria, ainda assim, que no caso do poder local, marcado pela proximidade, há um desafio acrescido: resistir a um certo modo de estar que julga tudo, incluindo o aspeto físico ou a forma de vestir de uma candidata.
Há quem tente justificar como piada a quantidade de "mêmes" espalhados pelas redes sociais comparando Alexandra Leitão, candidata à Câmara de Lisboa, a Íris Ascensão, que corre na Chamusca. Piada é, contudo, algo que a abordagem ao corpo das duas mulheres não tem. Mostra o quanto, por mais planos pela igualdade que se façam, a mulher continua a ser vista como um objeto ou peça decorativa obrigada a justificar tudo e que falha sempre nalguma coisa - seja porque se despe, ou porque não sabe vestir-se; porque se apresenta de cara lavada, ou porque se maquilha em "excesso".
Numa entrevista em 2024, Alexandra Leitão afirmou ser "bastante violento" o teor de e-mails que recebe sobre o seu aspeto físico. Podemos fingir que nada disto importa e que o que conta, em política, são as ideias. Fingimos que a realidade é como deveria ser, porque não conseguimos dar respostas à vida tal como ela é.