Entre os historiadores, há muito que o problema está identificado (que não resolvido): não se pode avaliar um determinado período histórico usando os valores de um tempo histórico diferente. É o que se chama um anacronismo.
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Esticando um pouco a corda, é o que se está a passar na digestão ao debate de ontem entre Donald Trump e Joe Biden. Há quase unanimidade entre as elites políticas e mediáticas mundiais, que se sintetiza num título: foi o pior debate da história. Sucede que isso resulta do recurso aos valores de um tempo político passado para avaliar o tempo político presente. Um anacronismo e, portanto, pouco útil. Conforta, mas não conserta. Na verdade, e outra vez esticando um pouco a corda, o que talvez se pudesse dizer é que foi um dos melhores espetáculos televisivos de sempre. Não concorda? Ainda que concordando, acha a constatação inconsequente? Lembre-se então que foram espetáculos televisivos como este que conduziram o "palhaço" que ontem esteve no palco até aos votos que lhe deram o cargo de presidente do país mais poderoso do Mundo. Perante um Trump que não distingue a verdade da mentira (é inútil desperdiçar adjetivos) e disposto a fazer o que for preciso para garantir mais quatro anos de poder (evitando a falência e talvez a prisão), o simpático "Uncle Joe" fez o que tinha de fazer: foi arrogante, provocador e rude, recorreu à difamação e ao insulto. É certo que nunca será melhor do que Trump no boxe. Falta-lhe treino. Biden pareceu ele próprio um anacronismo, um político no tempo errado (já leva meio século na arena). Na verdade, nada disso tem demasiada importância, face ao objetivo imediato: despejar da Casa Branca um racista que, tivesse o poder para isso, seria um ditador. Que ninguém se iluda, no entanto. Trump, mesmo derrotado, é um político deste tempo e protagonista de um "debate" político que está para ficar. Há muitos ignorantes e deserdados para conquistar. E muitos oportunistas na fila com a habilidade e os meios para o emular. Também na Europa, também aqui no nosso retângulo. Calma. Não está escrito em lado nenhum que eles passarão.
Chefe de redação