O Porto não é só o Porto, senhores candidatos
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Por certo que a habitação a preços proibitivos, o purgatório do trânsito e a insegurança percecionada são problemas que desassossegam os portuenses. A ninguém passaria pela cabeça refutar estas prioridades. Pergunto-me, porém, se o futuro do Porto se esgota em tal trio. Para quem tem acompanhado os debates televisivos, assim parece.
É deplorável que os candidatos portuenses tenham ido dobrar o joelho aos estúdios da SIC, em Lisboa, há dias. Mas a subalternização do Porto não passou apenas por essa capitulação. Ao aceitarem um debate circunscrito àquele trio fatídico, pactuaram com uma visão paroquial da cidade.
É que o Porto não é só o Porto. É a capital do Norte. O seu presidente da Câmara não é apenas "o maior da ilha dele", nem é somente responsável pelos limites estritos do seu território. O Porto é a metrópole de uma área metropolitana com quase dois milhões de almas e o epicentro - por enquanto - do Noroeste Peninsular.
Governar o Porto não é o mesmo que administrar um condomínio de 41,41 km². O Porto governa-se de olhos postos noutras escalas: a metropolitana, a regional, a nacional e a internacional. Em todas elas se joga o seu futuro, a prosperidade e o bem-estar dos seus habitantes. E até mesmo a resolução da tríade habitação-mobilidade-segurança.
Não conta, para estas eleições, o modelo de desenvolvimento económico que se preconiza? Queremos uma cidade de turismo? Uma cidade de serviços? De comércio? De indústria? De inovação e saber? Um recreio de startups? Um pasto para unicórnios? Não terá isso consequências na qualidade do emprego e no nível salarial? Não é nada connosco que o porto de Leixões tenha perdido, em 2024, a liderança do Noroeste Peninsular para o porto de A Coruña? Não interessa aos portuenses saber como pretendem os candidatos organizar a recomposição sociodemográfica do burgo por efeito da chegada de milhares de pessoas oriundas dos quatro cantos do Mundo, e zelar pela sua integração harmoniosa? São algumas interrogações de entre as muitas possíveis.
"O Porto enfim cessou de ser província. É segunda capital (segunda por ordem cronológica, bem entendido!)", escrevia Ramalho Ortigão, em 1883. Nestes dias decisivos, parece que o Porto cessou de ser a segunda capital e voltou a ser província.