Estamos apenas a duas semanas das eleições autárquicas, numa contagem decrescente em que os candidatos esgrimem os seus últimos argumentos para convencer os eleitores ainda não convencidos.
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No panorama nacional, resolvido que parece estar o caso de Lisboa com uma reeleição por grande margem de António Costa, a cidade do Porto será, por certo, uma das que mais vai atrair as atenções dos portugueses na noite eleitoral. Pela importância relativa do Porto enquanto cabeça de uma região económica e socialmente relevante e ainda pela rotura estridente da coligação que tem governado a cidade nos últimos 12 anos, o resultado eleitoral de 29 de setembro volta a transcender o simples impacto local.
Desde logo terá importância para a Área Metropolitana, a que o Porto tradicionalmente preside, mas também será relevante para o país pelas leituras políticas que permitirá. Daí que tenha significado conhecer o perfil dos candidatos, as suas ideias, os seus projetos, mesmo não se sendo eleitor na cidade. Depois da abstrusa decisão da Comissão Nacional de Eleições sobre a cobertura televisiva das eleições municipais que levou ao seu verdadeiro apagão da agenda nacional, valeu-nos o Porto Canal. Numa operação nada fácil de montar para assegurar a equidade entre todos os candidatos (incluindo aqueles que só o são para assegurar estes poucos minutos de visibilidade), a televisão do Porto possibilitou aos não eleitores da cidade ter uma perceção sobre a qualidade dos protagonistas e sobre os seus desígnios. É, uma vez mais, a sociedade civil portuense a prestar serviço público.
Sendo muito mais o que divide os diferentes candidatos do que aquilo que os une, dois aspetos são já formalmente consensuais - os sucessos desportivos da cidade serão publicamente assumidos pelo município; e a reabilitação urbana será uma prioridade para todos. Ora este é, sem dúvida, um projeto da maior importância para o Porto e para o país.
Lisboa e Porto são, sobretudo nos seus centros tradicionais, as maiores vítimas da política de congelamento de rendas que aconteceu no pós-guerra. A situação é hoje, porém, bem mais grave no Porto do que em Lisboa. As autênticas feridas urbanas visíveis na degradação do património edificado da cidade impõem a conjugação de esforços numa operação que necessariamente envolverá um considerável esforço financeiro e imaginação para congregar todas as opções disponíveis e estabilidade nas políticas. E, por isso, é de saudar a unanimidade registada no debate que juntou os candidatos à Câmara do Porto, a despeito das nuances que caracterizam cada uma das propostas de intervenção. Todos reconhecem o seu impacto positivo no emprego e no PIB, na atenuação dos problemas habitacionais e na imagem da cidade. Não é possível "vender" turisticamente o Porto com toda a sua história, os seus monumentos, a sua atividade cultural, por mais forte e atrativa que venha a ser, se o centro urbano continuar a degradar-se.
Ficamos a saber da disponibilidade de todos para considerarem ser este um dos mais agudos problemas que terá de encarar o próximo executivo. O que é de saudar. Mas virá, logo depois, a exigência seguinte - a necessidade de dispor de consideráveis meios financeiros que tragam dimensão ao projeto e lhe criem massa crítica. Numa situação de claro constrangimento financeiro do país, dificilmente o Governo terá disponibilidade para assumir compromissos de vulto neste projeto. Sem financiamentos a fundo perdido, numa altura em que o mercado habitacional está de gatas, não há solução possível. E o município, por si só, não tem condições para o fazer. Resta poder vir a contar com os fundos comunitários no próximo Quadro Estratégico Comum, como já avançaram alguns candidatos. Ora é aqui que está o nó górdio. A União Europeia, até hoje, tem-se mostrado avessa a comparticipar qualquer investimento habitacional. Com fundamentos vários, nomeadamente o da distorção do mercado, o apoio à reabilitação urbana na vertente habitação não tem sido permitido. Este é, no fim de contas, o grande problema que os candidatos, em conjunto, vão ter de resolver. Um deles será presidente e provavelmente três outros serão eleitos para o executivo como vereadores da oposição. Conseguir convencer Bruxelas e levar o Governo a colaborar é a magna tarefa que terão pela frente. Não será fácil. Mas se todos derem as mãos como hoje dizem, ao menos por uma vez, talvez o Porto consiga reabilitar não só as casas mas também a sua imagem.