Quando Cavaco Silva apresentou a recandidatura, em Outubro de 2010, já conhecia perfeitamente Sócrates. Era o único primeiro-ministro com quem o presidente trabalhara.
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"Herdou-o" em Março de 2006 e não tinha má impressão do socialista. Na campanha eleitoral para o primeiro mandato, considerara-o, conjuntamente com ele, uma pessoa "bem informada" que até chegava às mesmas conclusões de Cavaco.
Cedo, porém, percebeu que a maioria absoluta de Sócrates - que nascera sob o signo do "reformismo" que tanto impressionara a Direita - pendia para o absolutismo democrático. A personalidade feérica do primeiro-ministro ajudava, e o país foi-lhe sucessivamente retirando apoio.
Nas legislativas de 2009, perdeu quinhentos mil votos e a maioria. Todavia, continuaria a governar como se fosse maioritário e isso, entre outras infelicidades domésticas e internacionais, ser-lhe-ia fatal.
Na tomada de posse para o segundo mandato, depois de ter sido apoiado nas urnas pelo PSD e pelo CDS, Cavaco fez um discurso memorável sugerindo ser "altura de os portugueses despertarem da letargia em que têm vivido". Com o país falido, Sócrates foi forçado a pedir ajuda financeira internacional, já depois de ter entregado a demissão do cargo, e assina o PAEF com a Comissão Europeia, o FMI e o BCE que o Governo seguinte, da Direita em coligação, executaria até 2014.
Com Sócrates, Passos Coelho e António Costa, Cavaco recorreu ao princípio da cooperação estratégica nas relações com os primeiros-ministros e os governos. Não perdoou a Sócrates a "deslealdade institucional" de não lhe ter dado conta do famoso PEC IV, da Primavera de 2011, mas reconheceu posteriormente ao ex-PM algumas qualidades político-institucionais que em António Costa viu logo puramente "tacticistas". E, nas memórias, frisou que jamais Sócrates dera o menor sinal de alguma vez ter querido aliar-se ao PC e ao radicalismo para se manter no poder.
Marcelo vai dizendo que só falará da recandidatura depois de marcar a eleição de 2021. Sem a nomear, não tem feito outra coisa a não ser a campanha informal da recandidatura que não fará no Inverno porque não precisa. Não precisa da "política", nem das "elites".
É o presidente e o candidato natural do "povo". Das férias às promulgações e vetos, das visitas às faladuras, tudo são sinais a pensar em Janeiro. Costa manifestou o tão timorato quanto acrisolado empenho na reeleição. Outros altos socialistas já votaram nele por antecipação "sentimental". Só falta mesmo Marcelo "empenhar-se" um bocadinho junto dos seus.
(O autor escreve segundo a antiga ortografia)
*Jurista