Soube-se esta semana que o novo líder da autarquia de Guimarães pondera recuar quanto à decisão, anunciada pelo seu antecessor no início do ano, de abandonar o projeto Quadrilátero Urbano, uma rede de cidades minhotas criada há cinco anos. Este é um daqueles casos em que o acessório foi contaminando o essencial, até ao ponto em que uma boa ideia acabou sendo desvirtuada.
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Começando pelo início. A forma de organização administrativa do território nacional tem singularidades que, para quem estuda a matéria e conhece as soluções adotadas noutros países europeus, suscitam interpretações que têm pouco a ver com objetivos de desenvolvimento regional e de eficiência coletiva. A um governo central e centralizador sucede-se um mosaico de mais de trezentos municípios com órgãos eleitos. No meio, cinco comissões de coordenação, nomeadas pelo Governo, e um conjunto alargado de recém-criadas comunidades intermunicipais (CIM) e áreas metropolitanas (AM) para o caso do Porto e de Lisboa. Este desenho não é, nem tem sido, minimamente tributário do princípio da subsidiariedade. Fecham juntas de freguesia, escolas, maternidades, tribunais, repartições de finanças ou estações de CTT, para dar apenas alguns exemplos, por via de decisões tomadas a partir de Lisboa, sem que na região haja qualquer canal ou capacidade de argumentação ou de desenho de alternativas.
No caso do Minho, o desenho das CIM tem implícita uma ideia de divisão. Quem conhece o território e o seu tecido empresarial, institucional e social, sabe bem que Ave e Cávado interagem fortemente, como se existisse um magnete que os atrai. A linha separadora de águas atravessa a cidade de Braga a meio. Isto significa que, quando chove no seu Centro Histórico, há gotas de água que se encaminham para o Ave e outras que correm para o Cávado. Contudo, não foi considerada a união das duas CIM, não fosse o Minho ganhar escala, passar a rivalizar com outros na disputa de fundos e, quiçá, desenvolver-se demasiado. Já a AM do Porto está maior que nunca, integrando agora também Vale de Cambra, imagine-se! Este é um jogo em que não existem inocentes. Mas onde há também autarcas distraídos, de tão focados no seu burgo.
Por tudo isto, a que acresce a fragilidade do sistema urbano, sobretudo ao nível das cidades médias, ganha acuidade a constituição de redes urbanas que associam aglomerações onde existe proximidade física, elevada interação no seio da sociedade, das empresas e das instituições e a vontade de partilha de uma visão e de uma estratégia de futuro. A Política de Cidades do Programa Operacional da Região Norte 2007-13 procurou, embora timidamente, colocar na agenda esse potencial de associação, apoiando redes entre cidades que se organizam em torno da temática da competitividade. É nesse contexto que nasce o projeto do Quadrilátero Urbano, que adquiriu a configuração jurídica de Associação de Municípios para Fins Específicos integrando Braga, Guimarães, Famalicão e Barcelos.
Apesar do meu otimismo inicial, constato hoje que a colaboração entre municípios acabou por ser dificultada pelo modelo de gestão e pelas fricções locais. É sabido que o anúncio da saída de Guimarães se deveu à gestão dos protagonismos num período pré-eleitoral. Domingos Bragança diz agora que é tempo de voltar ao Quadrilátero e recupera o papel central da Universidade do Minho neste projeto. Percebo o seu racional, já que esta é a instituição mais bem posicionada para "agrafar" o Cávado e o Ave.
A ideia da rede urbana para a competitividade, inovação e internacionalização num espaço que inclui a melhor Universidade portuguesa em matéria de valorização do conhecimento, lado a lado com muitas das maiores empresas exportadoras de produtos transacionáveis, é mais do que nunca pertinente e deve estar em cima da mesa no próximo programa regional de fundos europeus. Mas os autarcas têm de perceber que importa focar no objetivo. O Quadrilátero não pode ser um espaço destinado à obtenção de fundos para financiar infraestruturas urbanas. Pode e deve ser reconhecido como o mais dinâmico e atrativo polo de competitividade territorial português baseado em cidades médias, que se organiza em torno do conhecimento e da inovação e se posiciona internacionalmente como um espaço de oportunidades.