O centralismo. A sua verdadeira dimensão é intangível.
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Senti isto quando esta semana na minha aldeia (agora vila) do Arco de Baúlhe me disseram que íamos ficar sem banco. O Arco é seguramente a freguesia com mais atividade económica (e população), a seguir à sede de concelho. No entanto, a sucursal do banco que a servia tem de desaparecer porque a sede entendeu que só terá, no interior, balcões abertos nas sedes de concelho. Sem cuidar de conhecer o território. Sem perceber que, nalguns casos, há freguesias com mais atividade do que as próprias sedes de concelho. E sem perceber que não é bom provocar permanentemente este movimento da periferia para o centro. Seja qual for a periferia. Seja qual for o centro.
É como a colocação dos professores, a colocação dos médicos. Ou o Festival da Canção.
Todos os anos, milhares de professores têm de submeter - e submeter-se a - uma candidatura para um kafkiano processo de afetação de docentes a escolas, que não raras vezes faz com que alguém de Bragança vá parar ao Montijo e alguém de Viseu a Alijó.
No caso dos médicos, todos os anos centenas têm de fazer um exame de utilidade muito dúbia, pelo menos para os que não vão seguir medicina interna, para posteriormente poderem escolher um hospital onde farão o internato da especialidade.
Finda a especialidade, os médicos recém-especialistas sujeitam-se a mais um processo controlado via Avenida João Crisóstomo, em Lisboa, para descobrirem para onde é que a sorte, e mais frequentemente o azar, determinou que poderão exercer.
E isto chega ao Festival da Canção. Em 2012, 2013, 2014 , 2015 e 2016 a Suécia (duas vezes), a Áustria, a Dinamarca e a Ucrânia abriram concursos públicos e transparentes para selecionar a cidade onde se realizaria o concurso no ano a seguir à vitória.
Em 2017, ganhamos nós. Pouco tempo depois, já se sabia que seria em Lisboa porque, de acordo com a RTP, "os organizadores sugeriram que fosse na Meo Arena".
Nada disto parece agora muito importante. Mas a covid vai passar. Esta forma de gerir o país continuará como doença larvar contra a qual não há meio de se descobrir uma vacina.
*Analista financeira