O Parlamento, leia-se, os deputados do PS absoluto, aprovaram o Orçamento do Estado para o ano corrente. Tudo o mais votou contra, menos aquelas duas originalidades solitárias do PAN e do Livre. Recordo que o Orçamento, este Orçamento, fora a menina dos olhos do doutor Marcelo.
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De tal forma, que o presidente da República dissolveu a anterior legislatura parlamentar e convocou as eleições de Janeiro. Passou o Outono a ameaçar dissolver a Assembleia se o OE não fosse aprovado, e cumpriu. O resultado é conhecido. Maioria absoluta para o terceiro Governo de Costa, redução do grupo parlamentar do PSD de Rio, terceiro e quarto lugares em deputados, respectivamente para o Chega e para a Iniciativa Liberal, e os antigos parceiros do PS "relativo" reduzidos a pouco mais que escombros. O PC, por causa da guerra da Ucrânia, passou rapidamente do partido exemplar no cumprimento dos compromissos nacionais que assume a um mostrengo execrável do qual é obrigatório dizer mal todos os dias no concurso "quem é mais amigo dos ucranianos em Portugal". É o "preço certo" que o PC paga, por um lado, pela sua coerência (não estou a valorizá-la, nem a favor nem no sentido que a manada lhe atribui), e, por outro, por ser dispensável uma vez conseguido o absolutismo socialista. De regresso ao Orçamento, todos nos lembramos daquele momento evangélico em que, no fim do debate nas televisões entre Costa e Rio, o primeiro terminou a exibir a capa azul do OE para 2022, sem dizer palavra. Ninguém entendeu o movimento oracular, mas António Costa explicá-lo-ia a semana passada durante o debate do Orçamento. As eleições de 30 de Janeiro, afinal, tinham sido um referendo àquele Orçamento da capa azul. Na cabeça do homem do pensamento mágico socialista, aos eleitores, no silêncio da cabina de voto, não lhes ocorreu mais nada a não ser a visão do Orçamento da capa azul. Logo, aquele debate até seria praticamente desnecessário, quase tanto como a presença do ministro das Finanças que o protagonizou. Medina vinha com o trabalho de Leão feito, e bastaram-lhe uns toques aqui e ali - sobretudo de retórica partidária em que ele ferve e estava morto por voltar a verter desde Setembro -, mais a desculpa da guerra, para o livrinho da capa azul verter-se na lei que Marcelo, o primeiro interessado na coisa e, agora, tão desinteressado por ela, promulgará com, talvez, duas ou três frases inócuas de "recados" para o "Expresso" valorizar na página 9. Cumpriu-se o oráculo. Saíram de São Bento, todos contentes, com 7,2% de inflação. E Medina ainda será conhecido pelo "senhor 10%" se isto continuar como prometem os custos das matérias-primas. E não, evidentemente, não é nenhuma "comissão". É mesmo inflação, o custo da vidinha. Aquilo que Você sente quando enche o depósito ou compra um queijinho de Seia para fazer papo com uma carcaça.
o autor escreve segundo a antiga ortografia
*Jurista