Corpo do artigo
Num país onde o sol brilha generosamente sobre telhados e ruelas estreitas, cresce uma sombra que poucos ousam nomear com a gravidade que merece: estamos a encolher. Não em espírito, mas no espaço onde vivemos. As nossas casas, esse abrigo onde a vida acontece, tornaram-se pequenas para as rotinas comuns e para os sonhos de alguns.
Os números refletem que as áreas das casas em Portugal estão a diminuir. Apartamentos de 60 m2 são o novo normal para as jovens famílias: uma cozinha do tamanho de um armário, uma sala que mal cabe o sofá e quartos onde se dorme, trabalha e estuda por falta de alternativa. E um T0, sem varanda e com kitchenette, é vendido como “ideal para casais dinâmicos”, como se dinamismo compensasse a falta de espaço para respirar. Na pandemia, quando as paredes se tornaram fronteiras absolutas, compreendeu-se com crueza o que significa viver apertado. O silêncio das ruas e o eco das videochamadas mostraram que não há saúde mental num T0. Não há espaço para brincar, respirar, discutir ou reconciliar. A casa tem de ter um canto para ler, outro para dormir e, quem sabe, um para pensar.
Quantos jovens casais discutem em voz baixa para não acordar o bebé que dorme ao lado da sala-cozinha-quarto-escritório? Como se pode viver num quarto onde não cabe uma cama e duas mesinhas de cabeceira? Não se pode. As soluções não podem vir só dos algoritmos do mercado financeiro. A arquitetura tem de recuperar a sua dimensão humanista. O espaço da casa é o tempo que precisamos para nos restabelecermos para o dia seguinte. Habitar não é só ocupar m2, é ter espaço para ser humano.