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1. Há 14 anos que Manuel Godinho se dedica à extração ilegal de areias na Quinta dos Ananases, em Ovar, classificada como Reserva Ecológica Nacional. O truque usado pelo sucateiro mais conhecido do país (foi condenado a 17 anos de cadeia no "Face Oculta") não tem nada de sofisticado. Extrai a areia e envia os camiões para o outro lado da rua, onde uma empresa cujo nome foi mudando ao longo dos anos assume a mercadoria como sua e a despacha para o cliente final. Os buracos da areia que sai são usados como depósito de pneus, betão, tijolos e até cassetes de vídeo. No fundo, enche-os com sucata, que é a sua especialidade. Mas o que é verdadeiramente extraordinário é que toda a gente sabia disto muito antes de o JN o denunciar. A Câmara Municipal de Ovar sabia disto. A GNR sabia disto. A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Centro sabia disto. Todas estas instituições já o multaram, aliás, pelos crimes cometidos. Até os tribunais sabiam disto: em março deste ano, foi condenado a uma pena de dois anos de cadeia, precisamente por subornar, com 2500 euros, um vigilante da Natureza e assim evitar a fiscalização de extração de areia na Quinta dos Ananases. Acabo como comecei. Isto já dura há 14 anos. E toda a gente sabia. Têm a certeza de que o vigilante da Natureza foi o único a ser subornado?
2. O ano letivo aproxima-se do fim e dezenas de milhares de alunos do Ensino Secundário preparam-se para os exames nacionais. Um momento fundamental para os que têm a possibilidade e o objetivo de chegar ao Ensino Superior. Acontece que os alunos não partem todos do mesmo patamar. Os que podem pagar escolas privadas estão em vantagem relativamente aos que frequentam a escola pública. Calma, não se trata de "cegueira ideológica" relativamente ao ensino privado, apenas de relembrar estudos científicos, certificados pelo Conselho Nacional de Educação, que denunciam o sistemático recurso à inflação de notas por parte de muitas escolas privadas. Uma batota que se repete de ano para ano, à vista de todos, incluindo sucessivos governos, que se limitam a olhar para o lado. Segundo os especialistas que estudaram o fenómeno, é uma "tremenda fonte de injustiça". De tal forma que, dizem, até um sorteio se revelaria "mais justo" do que o atual sistema de colocação de alunos no Ensino Superior. Eu vou repetir, para o caso de alguém se ter baralhado: para escolher os alunos que querem entrar no Ensino Superior Público seria mais justo fazer um sorteio do que usar as notas conseguidas ao fim de 12 anos de estudo. Tal como no caso do sucateiro referido acima, esta batota já dura há muitos anos. E toda a gente sabe.
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