O fecho do ano de 2013, agora consumado, confirmou algumas boas notícias nas frentes da nossa economia e das contas do Estado. Conquistas certas e seguras? Não sei, oxalá que sim.
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Não sei, porque os nossos problemas estruturais podem ser pouco visíveis, podem mesmo ser sofismados, mas na verdade existem e não estão resolvidos. Convido o leitor a ver comigo duas ideias. Uma, é o repto europeu do Reformador: o modo e o tempo de ele interpelar a UE, a fim de obter, para Portugal, uma justa compreensão. A outra, é o triângulo do Reformador, ou seja, os bicudos vértices que ele tem de conciliar e vencer com medidas sobretudo estruturais: Regramento do Estado; Reforma do Estado; Crescimento.
O plano, o pacto e o repto...
Com a economia e as finanças em estado estrutural de necessidade, o Reformador está preso à Zona Euro, para o bem e para o mal. Estando preso como está, só por si, ele não pode ir longe. Poderia desprender-se das grilhetas, mas esse acto unilateral não seria a melhor opção quando a prisão monetária já é o que é. Ele está atado de pés e mãos. Então, ele precisa de ter um plano e um pacto internos. E fazer um repto externo.
Na vertente interna, ele deve armar-se de um plano reformista longo (10 anos?), comprometendo-se com medidas estruturais, algumas excepcionais, algumas a priori talvez proibidas por regimes europeus. E deve reunir as razões mais fortes, todas juntas, mais as razões da concertação social e do consenso político, num pacto de grande visão - um pacto reformista longo. Não alcançar um tal pacto é como um náufrago morrer na praia. O pacto tem sido aconselhado por observadores, sou apenas um entre muitos. E, mais importante do que isso, tem sido sinalizado pelo PR, pelo governador do BdP, pelo presidente do CES.
Na vertente externa, o Reformador precisa de se apresentar à Europa com o plano e o pacto. É nisso que deve traduzir-se o repto europeu, um conjunto de acções reformistas, plurianuais, articuladas, que se entrelaçam e se viabilizam entre si. Cada uma delas, isolada, perde valor e convencimento, ou nem sequer é viável. O repto deve ser feito de uma só vez, com dimensão, sem fragmentar propostas, sem descolar da realidade e do sentido das proporções, sem ser timorato nem temerário, tudo num gesto de respeito e credibilidade da República, tudo acompanhado pelos nossos embaixadores, tudo em recato institucional (enfim, não sei se o repto está a ser tentado). E com a força moral de quem, da austeridade, tem provas dadas - o país já as deu, e de que maneira, em contexto troikiano.
A Europa também é responsável?
Com o seu repto, pode o Reformador abrir o caminho, aí sim, para um verdadeiro milagre económico português. As políticas de investimento e de financiamento da economia, em particular das PME, devem ser capítulos decisivos do plano. E porque temos um problema estrutural de défice externo (sim, temos), o plano deve favorecer as empresas dos bens transaccionáveis, ou seja, das exportações e da substituição concorrencial de importações. Isso pode, mais uma vez, esbarrar nos regimes da UE.
Contudo, além do mais, a Europa tem a sua quota-parte de responsabilidade na lusa situação. Quer porque a UE congeminou a ideia da união monetária, para a qual fomos aliciados e nela embarcámos, fomos prematuros. Quer porque a UE avançou, fora dos trilhos, para o alargamento a 28 membros. Quer porque a UE escancarou o comércio a terceiros países, de concorrência desleal. Quer porque a Zona Euro cometeu o tremendo erro de deixar propagar o alarme da reputação de dívidas soberanas do euro. Quer, finalmente, porque o desemprego é um flagelo europeu, do qual nós temos uma das piores incidências, seja no desemprego jovem seja no desemprego estrutural.
O triângulo é insolúvel?
O leitor pode ver na figura um resumo simplificado destas ideias. A conjugação dos vértices do triângulo é capaz de desanimar o Reformador. Por exemplo: será que o 1.0º vértice (Estado regrado) e o 3.0 vértice (crescimento e emprego) prefiguram rotas de colisão? Na busca de soluções, guardei há um ano um cenário que aconselho ao Reformador para ele balizar o plano e o pacto e tentar dominar o triângulo. Com gradualismo de objectivos e medidas, que é uma condição do repto, o Reformador pode reduzir a despesa pública e a carga fiscal. Pode regrar as finanças e honrar a dívida da República. Pode ajudar a economia a crescer. E tudo, sendo muito difícil como é, torna-se relativamente praticável desde que haja estatura política (eis o Reformador), haja permissão para renegociar honradamente parte da dívida e usar certas políticas do plano (eis a Europa), haja o pacto dos parceiros sociais e dos principais partidos (eis o país).
O autor escreve segundo a antiga ortografia