Há centenas de meninas iranianas a serem envenenadas em escolas primárias e secundárias. Sim, envenenadas quando deviam estar num ambiente seguro a aprender.
Corpo do artigo
Os primeiros episódios ocorreram em novembro mas só recentemente se começou a perceber a real dimensão do problema. A origem das intoxicações - que para já não causaram mortes - ainda não foi esclarecida, mas os efeitos são dramáticos. Há quem aproveite para defender o fecho das escolas femininas, outros culpam o regime que tenta desde setembro calar os protestos na sequência da morte de Mahsa Amini (espancada por não usar o véu islâmico), e o Governo contra-ataca com a teoria de que se trata de uma "conspiração do inimigo para criar medo e desespero entre a população".
Vamos aos factos. Os primeiros casos surgiram em Qom, a cerca de 125 quilómetros de Teerão. Estudantes do Conservatório de Noor Yazdanshahr apresentaram, no final de novembro, sinais de envenenamento. Entretanto, os episódios multiplicaram-se pelo país. Estão contabilizadas centenas de meninas de mais de 50 escolas hospitalizadas com sintomas que vão desde dores de cabeça, palpitações cardíacas, letargia a paralisia. Todos os casos, com uma exceção, ocorreram em instituições femininas, o que faz aumentar as suspeitas de que são envenenamentos intencionais com um alvo concreto: raparigas que frequentam a escola e que contestam o regime. Situações idênticas sucedem desde 2009 no Afeganistão, outro país que faz da educação das mulheres uma causa a abater.
Agora, o contexto. Com uma economia fragilizada pela pandemia e um regime teocrático apoiado numa polícia da moralidade, o Irão enfrenta uma onda de contestação que as forças de segurança não conseguem conter apesar da violenta repressão (centenas ou milhares de manifestantes abatidos, espancamentos diários, julgamentos sumários, mortes violentas catalogadas como acidentais). Na rua, na escola, nas redes sociais, a luta não esmorece contra a imposição do hijab, a proibição de uso de contracetivos, as limitações à educação e à carreira das mulheres, o incentivo dos casamentos precoces e o controlo total que os maridos podem exercer sobre as mulheres.
A tudo isto a comunidade internacional responde com sanções impotentes. E as meninas do Irão continuam a morrer. Nas vésperas do Dia Internacional da Mulher, recorda aos distraídos a atualidade da luta pela igualdade de género.
Editora-executiva-adjunta