"O país fica a dever mais um favor ao Porto!" foi o comentário mais cínico que ouvi aos resultados das eleições legislativas. Em causa a votação do PSD e o facto de Pacheco Pereira, Aguiar Branco, Paulo Rangel, António Borges e Agostinho Branquinho, todos do Porto, serem dos conselheiros mais próximos de Manuela Ferreira Leite. Na verdade, MFL deixou-se acantonar numa táctica política que, podendo resultar em eleições a feijões, como são consideradas as Europeias, nada dizem ao eleitorado, em geral, quando está em causa o governo do país numa situação de crise. Um partido que quer ser alternativa de poder dificilmente consegue levar a água ao seu moinho com um pedido de cheque em branco. Para além do tema das PME, em que não se distinguia dos outros partidos, é difícil lembrarmo-nos de uma única proposta económica dos sociais-democratas. O povo quer pão e circo. O que lhe propôs o PSD? A luta contra a asfixia democrática. Anunciada com pompa e circunstância na Madeira, assim cumprindo o critério do circo. Faltou o pão. A arrogância intelectual paga-se caro. Em actos eleitorais não basta ter razão, é preciso saber ouvir. Os eleitores já tinham problemas de sobra. Queriam soluções, esperança, até mesmo milagres. Pediam alegria. MFL deu-lhes fado. Perdeu! Como perdeu, mesmo com um deputado a mais, a CDU cujos "corais alentejanos" anunciam demasiado trabalho e calor para o povo urbano. O PC fartou-se de labutar, desde a guerrilha que esperava Sócrates onde quer que fosse, às grandes manifestações. Embriagou-se com a sua capacidade organizativa. Não percebeu que estava a chocar ovos alheios, a trabalhar para os "cucos" do Bloco de Esquerda que capitalizaram (sem segundas intenções!) esse esforço em proveito próprio. Aparentando ser um dos grandes vencedores, o BE arrisca-se a ter uma vitória de Pirro, ficando atrás do CDS e não conseguindo eleger um número de deputados que lhe dê poder negocial junto do PS. Demasiado grande para continuar a brincar às histórias da carochinha, demasiado pequeno para ser indispensável, demasiado sectário para estabelecer pontes, o BE está numa encruzilhada. O patético discurso de Louçã demonstra já essa angústia?
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O CDS ganhou em toda a linha. Revelou coragem e determinação. Partindo de uma linha política ambígua, foi-a depurando e centrando em quatro ou cinco temas que diziam alguma coisa ao eleitorado, mesmo de Esquerda. Viu essa coerência recompensada com os votos dos que perceberam que o PSD não "ia lá". Atingiu o patamar que o torna num interlocutor relevante para a estabilidade política. Pensionistas, agricultura, segurança, premiar quem trabalha são assuntos em que parece possível encontrar denominadores comuns com o PS. Não será fácil. A birra megalómana de ser o último a falar não é bom prenúncio.
A seguir às Europeias escrevi aqui, numa metáfora futebolística, que o PSD era o campeão da pré-época. O PS desorientou-se e deu vários tiros nos pés. Lentamente, foi-se recompondo, acabando por vencer. Vitória face às expectativas. No pior dos cenários: com menos deputados que a soma de PSD e CDS, só formando maioria, à Esquerda, com BE e PC juntos. Condenado a entender-se com o CDS? O teste definitivo para perceber se Sócrates é um verdadeiro homem de Estado. O país espera que sim! E Cavaco?