Insuficientemente relevada, mas com um papel tremendo na formação cívica das crianças, a pequena revolução em curso no futebol, após a introdução de equipas mistas nas camadas jovens, é paradigmática de como as questões da igualdade de género dependem mais da formação progressiva das consciências do que da deformação excessiva das consciências.
Corpo do artigo
Hoje, para grande parte dos rapazes que jogam é tão natural disputarem a bola com uma rapariga como não terem complexo em serem substituídos por uma Sónia ou uma Matilde. Fundamentalmente porque não veem nelas meninas, mas apenas o que elas são: colegas de equipa. Parece coisa pouca, mas não é: no meio de tanta selvajaria e atropelos ao civismo e educação, e atendendo ao inferno mediático em que se transformou o futebol profissional, esta nova normalidade não só é refrescante, como funciona como um bálsamo para a alma de quem quer ver futuro. Formar e não deformar resulta sempre num ganho geracional. E quando olho para o que aconteceu na gala da "France Football" dá-me ainda mais vontade de agitar estes exemplos da base da pirâmide. Pela primeira vez na história do prémio, foi atribuída uma "Bola de Ouro" a uma mulher. Objetivo: projetar a igualdade de género e de oportunidades. Só que os feitos desportivos da norueguesa Ada Hegerberg acabaram por ser menorizados por uma piada do apresentador, Martin Solveig, que lhe perguntou se queria fazer twerk em palco (uma dança provocadora em que os glúteos ganham vida própria). A piadola sexista foi esquecida passadas umas horas, com um pedido de desculpas do autor e graças a um enorme fairplay da jogadora norueguesa do Lyon. Ainda assim, no momento de glória de Ada Hegerberg, e de tantas outras mulheres, falou-se muito mais do que ela não fez com um vestido dourado justinho do que sobre o conteúdo do seu discurso ou sobre a beleza dos seus golos. A revolução está em marcha, mas em velocidade lenta. Talvez para o ano convidem uma mulher para apresentar que desafie Ronaldo ou Messi a esfregar-se num varão ao som de "It"s raining men". Eu ria-me.
Diretor-adjunto