Corpo do artigo
Os partidos parecem adeptos do provérbio segundo o qual em tempo de guerra não se limpam armas, o que, em politiquês, pode querer dizer que em vésperas de campanhas eleitorais os princípios éticos contam pouco
Sem que alguém aparentemente se incomodasse com isso, os partidos aprovaram esta semana, com inusitada concordância (só mesmo o voto contra de António José Seguro evitou a unanimidade), uma nova lei de financiamento dos partidos que duplica, em relação à lei anterior, o valor que os partidos podem receber de privados e que passa de 20 mil euros para mais de um milhão de euros a verba que os partidos podem receber em dinheiro vivo. Magoado com o que a política lhe fez e atento à realidade, Luís Filipe Menezes alertava-me, há dias, para o facto de há um ano ter sido acusado de lavagem de dinheiro por Manuela Ferreira Leite, Rui Rio e 12 ex-secretários gerais do PSD por permitir que os militantes pagassem as quotas em dinheiro - 12 euros por ano. Menezes tem razão. Ninguém do seu partido clamou agora. Pior: todos os partidos disseram que sim, deixando os 12 euros da quota aceite por Menezes parecer uma história de meninos de coro. A verdade é que os partidos parecem adeptos do provérbio segundo o qual em tempo de guerra não se limpam armas, o que, em politiquês, pode querer dizer que, em vésperas de campanhas eleitorais, os princípios éticos contam pouco. A verdade é que os gastos previstos em propaganda eleitoral para as Europeias que estão à porta vão bem acima do dobro do valor gasto em 2004. Andámos claramente para trás, mas não apenas neste caso.
Por largos minutos, o clima duro dos piores tempos de 75 dominou os noticiários televisivos do 1.º de Maio. Pior do que as agressões e do que os insultos - que sempre se podem atribuir a um bando de energúmenos - foram as reacções de dirigentes que têm responsabilidades. Pior do que o indíviduo que ontem aparecia na capa do JN de dedo em riste para Vital Moreira puxando a camisola para o rosto para que ficasse tão irreconhecível como qualquer mascarado assaltando uma diligência no far-west, pior do que isso é ouvir o secretário--geral do PCP dizer que não pode comentar porque não viu as agressões e ouvir Carvalho da Silva, ainda no quente da refrega - mas ele tem de saber reagir a quente - dizer que não tem de pedir desculpa e que as pessoas - os agredidos - têm de pensar para onde vão fazer campanha, "ter cautela nos espaços escolhidos". Em que país, Carvalho da Silva, é que são necessárias tais cautelas? Em Portugal?
Não se pode, não se deve, passar ao lado de afirmações destas, porque os grandes valores democráticos não podem ser postos em causa. Os comunistas mais empedernidos, os sindicalistas mais extremistas têm de saber que estão isolados e que não conseguirão impor o clima de medo que se viveu em muitas ocasiões de 75. Os tempos são outros, não vai ser preciso nenhum comício na Fonte Luminosa como o que Soares e Zenha organizaram. Mas é preciso que se diga que Vital Moreira tem todo o direito de andar por aí, que a ministra da Educação pode visitar escolas sem ser insultada ou agredida com ovos ou que o primeiro-ministro se pode movimentar sem esperas de Sindicatos. Numa altura em que o descontentamento tende a crescer, que o desemprego vai bater duro, que muitas famílias passarão grandes dificuldades, era bom saber que se poderia contar com a CGTP e o PCP para ajudarem na resolução dos problemas e não para cavalgarem esses problemas em benefício não se sabe bem de quê nem de quem.