Carolina foi a primeira mulher a votar em Portugal, num tempo em que as mulheres não podiam votar. Invocando a lei de então, que só reconhecia o direito de voto aos "cidadãos portugueses com mais de 21 anos, que soubessem ler e escrever e fossem chefes de família", a comissão de recenseamento tinha-lhe negado o direito a inscrever o seu nome nos cadernos eleitorais.
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Carolina teve de recorrer a tribunal. Letrada, viúva, mais de 21 anos e com uma filha menor a cargo foram argumentos bastantes para que o juiz João Baptista de Castro assinasse a sentença que ficou para a história: "Excluir a mulher, só por ser mulher, é absurdo e iníquo e em oposição com as ideias da democracia e justiça proclamadas pela República. Onde a lei não distingue, não pode o julgador distinguir. Pelo que mando que a reclamante seja incluída no recenseamento eleitoral".
Carolina votou. Foi, em 1911, a vez primeira de uma mulher em Portugal, mas foi sol de pouca dura. A República tinha vencido há menos de um ano, vacilava, e a lei seria alterada logo no ano seguinte, reservando o direito de voto aos "chefes de família do sexo masculino". Desligando o canal história, recordemos apenas que foi só depois de abril de 1974 que o direito de voto se tornou universal em Portugal.
Hoje, as mulheres portuguesas são a maioria do universo eleitoral português, pelo que o voto feminino será sempre decisivo na contagem de logo à noite. Vamos, pois, votar com elas!
E que o nosso voto, o voto de cada um, sirva, ao menos, para render singela homenagem à memória de Carolina Beatriz Ângelo e àqueles e àquelas que, durante gerações, se bateram pelo mais básico direito de cidadania, o de decidir, eleger e ser eleito.
É esse um dos pilares republicanos, um valor que aqui evocamos, na véspera do aniversário da República, pesem embora a vontade dos deputados que decidiram suspender o feriado que a festejava e a do presidente da dita que anunciou abster-se de a comemorar.
Vamos votar. Sem participação política a cidadania definha, a democracia esmorece, as instituições degeneram, os poderes corrompem, e as reformas que reclamamos são adiadas com maior facilidade. Portugal deve demonstrar hoje uma grande votação democrática.
Vamos votar. Em democracia, o melhor antídoto contra a anestesia cívica encontra-se nas urnas. Os eleitores já assumiram as suas opções e é decisivo que não fiquem em casa. E que hoje, apesar da chuva que possa ocorrer, compareçam nas assembleias de voto em grande número.
É assim o direito de decidir. Incerto como a liberdade.