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O primeiro-ministro António Costa viaja amanhã para o Brasil e é recebido, quarta-feira, pelo recém-empossado presidente Michel Temer, antes da cerimónia de abertura dos Jogos Paralímpicos, no Rio de Janeiro.
O ambiente que espera Costa oscila entre a ressaca da Esquerda brasileira e a euforia de uma elite política e empresarial que fez tudo para derrubar Dilma.
Aquela que ainda há pouco era considerada a terceira mulher mais poderosa do Mundo caiu de empurrão, em julgamento político no Senado, numa semana que marca um antes e um depois na história do país. Ela, que há dois anos fora reeleita por mais de 54 milhões de votos, acabou destituída por decisão de 61 contra 20 senadores, numa câmara onde mais de metade deles está a contas com a Justiça.
Esfumada a chama olímpica e afastada a Esquerda do poder, o anfitrião de Costa chefia agora um governo de transição até novas eleições, dentro de dois anos, apostado em inverter o declínio económico, travar a inflação e o desemprego galopantes.
Com Temer, ele próprio indiciado num dos escândalos de corrupção que mina a credibilidade dos políticos brasileiros, está uma legião ministerial de 22 homens de meia-idade, todos brancos, num país maioritariamente feminino, jovem e mestiço. Nenhum deles foi eleito. E foi esse o verdadeiro golpe de Estado, o que conduziu ao poder gente sem o voto e apoio populares.
No labirinto da crise - que é económica, política e moral - dificilmente o mais poderoso país da América Latina conhecerá melhores dias antes de novas eleições, em 2018. E aí, a Direita que hoje festeja a queda de Dilma pode voltar a conhecer a derrota. Por uma razão muito simples: o Brasil é um país rico onde a maioria da população é pobre. E, em democracia, não há políticas liberais que sustentem esta matemática, tanto mais que a austeridade fiscal anunciada pelo novo Governo penaliza em especial os mais pobres e a classe média.
Desacreditado entre portas, o transitório presidente brasileiro aposta na política externa, querendo ganhar fora o crédito de legitimidade que lhe falta na política interna. Na China, por exemplo, onde ainda ecoa o argumento de Deng Xiaoping segundo o qual "não interessa a cor do gato, seja preto ou branco, desde que cace ratos". Não por acaso, é de Pequim que Michel Temer regressa hoje mesmo, na sua primeira visita oficial. Na mala traz o anúncio de um mega-investimento chinês de 3 mil milhões de dólares para um projeto de produção de aço no Estado do Maranhão. E em cima da mesa está o projeto, também ele chinês, de construir uma via-férrea transoceânica, que cruze o Brasil entre o Atlântico e o Pacífico.
* DIRETOR