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Não sei quantos mais "piores dias do ano" Portugal consegue aguentar. Nem sei como é que se diz àquelas pessoas que melhores dias virão. A confiança esfumou-se, ardeu à vista de todos e deixou-nos às cegas. A palavra incêndio é agora sinónimo de inferno.
Estado falhado, estado de guerra, estado de sítio, é este o estado em que ficámos, e ninguém nos diz nem como, nem porquê. Só se sabe o onde e o quanto, e os números são impossíveis de aceitar por que não são números, são pessoas e as pessoas não se contam.
Em Portugal, a culpa não morre solteira. Fica viúva. Sobrevive a tudo e a todos sem apanhar ninguém. Enquanto a culpa vive, os inocentes continuam a morrer e não há desculpas, só há impunes, são anos e anos de impunes que vão passando sempre entre os pingos da chuva, quando ela finalmente começa a cair. "Ad petendam pluviam", que venha a chuva, a chuva tudo faz esquecer, para a próxima logo se vê, pode ser que morra menos gente.
Mas não pararam de morrer, ou de fugir ou de morrer a fugir. E, agora, do pouco que restava, já pouco resta. Eis o país que gosta de brilhar, tem a superfície bem polida e o interior todo queimado. Portugal é o quintal abandonado do Terreiro do Paço. À frente, o sol e a luz; nas traseiras, o negrume sujo e esquecido das coisas maltratadas que já não servem. Ou que nunca serviram.