Vivemos cada vez mais. Inovações tecnológicas e desenvolvimento científico ajudam a prolongar a vida para patamares inimagináveis há uns anos. Existe, no entanto, um problema: as políticas públicas não acompanham tamanho progresso. Quem gere as nossas instituições e planeia as nossas cidades tem em mente, sobretudo, uma geração em idade ativa. E isso revela-se extremamente perigoso, como o atual caos na saúde bem documenta.
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A edição desta semana da revista "Time" coloca em capa um expressivo bebé, acompanhado do título "este bebé pode viver até aos 146 anos". No interior da publicação, um extensíssimo dossier explica o progressivo desenvolvimento cognitivo que nos acompanha e o gradual crescimento físico que registamos. A tecnologia tem ajudado a esticar a linha da vida, introduzindo, por exemplo, processos que melhoram significativamente a nossa alimentação (uma correta conservação dos alimentos, uma apurada purificação da água...). As ciências sociais, por seu lado, oferecem um contributo importante, debruçando-se com maior profundidade sobre os novos estilos de vida, ajudando a repensá-los em prol de um quotidiano com mais qualidade e de um planeamento do futuro mais inteligente e mais articulado com o progresso.
Acontece, porém, que as sociedades do Mundo dito desenvolvido não se coadunam com este aumento exponencial da esperança de vida. Os transportes estão pensados para jovens e adultos ainda ativos; o sistema educativo está planeado, sobretudo, para aqueles que ainda não entraram no mercado de trabalho ou para aqueles que, trabalhando, querem progredir na sua carreira. Nada é planeado para os mais velhos como se estes, chegados a tal estádio da vida, devessem ser rapidamente acantonados para morrer sem incomodar ninguém e, mais importante, sem subtrair grandes recursos.
Pela primeira vez na história dos Estados Unidos, o número de pessoas com mais de 65 anos é superior ao número de jovens com menos de 15 anos. A população americana está a envelhecer. E isso exige que se pensem outras políticas, principalmente nas cidades onde, a nível mundial, vive 54 por cento da população. Nos EUA, as grandes urbes acolhem 80 por cento dos americanos. E eis como os autarcas adquirem aqui uma gigantesca importância. Quem tem a seu cargo a gestão de uma cidade tem de repensar tudo. Rapidamente. À medida que envelhecemos, os nossos mundos ficam mais pequenos, assumindo um enorme valor as conexões físicas que o contexto possibilita. Por exemplo, ao bairro onde habitamos ou às lojas que frequentamos. Também os responsáveis pelas políticas centrais são atores fundamentais. Quem planeia o sistema de saúde tem de o preparar para uma população com novas exigências e cada vez mais necessitadas de ajuda médica. Vivemos mais, mas temos mais doenças crónicas ou mais enfermidades que necessitam de eficazes cuidados de saúde.
Tudo isto, quando perspetivado à escala do nosso país, salta para o domínio da ficção. Como pensar de outro modo as cidades, se muitos dos autarcas correspondem a uma geração habituada a identificar o progresso com o desenvolvimento infraestrutural? Como esperar um sistema de saúde que acolha bem os mais velhos, se os hospitais públicos entram em rutura apenas com um surto de gripe? Podemos viver cada vez mais, mas, na verdade, elegemos quem nos subtrai qualidade de vida, quem não é capaz de pensar políticas que recoloquem no centro da sua ação medidas ao serviço de uma sociedade que está cada vez mais velha.
Outro dos pontos que a "Time" explora é o de saber se as pessoas casadas vivem mais tempo. A resposta é sim, especialmente no caso dos homens. Os especialistas explicam que ser casado, na velhice, constitui um grande fator de sobrevivência, porque é no lar que as pessoas encontram apoios físicos e emocionais revigorantes. Ora, tendo em conta as estatísticas dos divórcios, poder-se-á considerar que, no plano individual, cada um de nós também pouco faz para criar a sua sustentabilidade.
PROFESSORA ASSOCIADA COM AGREGAÇÃO DA UMINHO