Diz a lenda que Hércules foi condenado pelo oráculo a realizar 12 trabalhos para se redimir perante os deuses. Graças à sua força e resistência extraordinárias, e à ajuda de Iolau, Hércules foi bem sucedido e ocupa lugar de destaque na mitologia grega. Tal como a Hércules, foi exigido à Grécia que leve a cabo trabalhos de grande dificuldade para aplacar a fúria dos seus credores, sob pena de ser expulsa da Zona Euro.
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A chamada capitulação da Grécia, após a retumbante vitória do "não" no referendo do dia 5, causou grande perplexidade. Tudo levava a crer que, com tal resultado, Tsipras iria estar em condições de resistir melhor às exigências dos seus parceiros. Mas o que se passou não surpreende. Tsipras foi "encostado à parede": ou aceitava o acordo ou então a Grécia saía do euro. De facto, a vitória do "não" não o mandatou para decidir a saída do euro, algo que os gregos não desejam. De mais a mais, Tsipras, após uma semana em que os bancos estiveram fechados, percebeu bem que se o acordo não é uma boa notícia para os gregos, a saída do euro seria bem pior.
O acordo preserva a integridade da Zona Euro, o que é positivo. Sendo o caso grego o mais delicado e mais difícil no seu seio, daqui em diante, cenários de saída não farão sentido. Não só pelo precedente agora criado, mas também porque no atual quadro europeu de coordenação e monitorização das políticas económicas, com mecanismos de prevenção de crises mais exigentes e eficazes, será muito difícil algum país chegar à situação a que a Grécia chegou.
Mas a principal questão é saber se a Grécia é capaz de cumprir este acordo. Tsipras já reconheceu que não e tem razão. Sem um alívio da sua dívida, qualquer programa estará condenado ao insucesso. O FMI já reconheceu que tal deveria ter sido feito no primeiro resgate. A restruturação de 2012 revelou-se insuficiente e o FMI alerta, agora e novamente, para a insustentabilidade da dívida grega. O sucesso do programa grego não é um problema exclusivo da Grécia. Assim como Hércules teve a ajuda de Iolau, a Grécia precisa do apoio das instituições credoras que lhe impuseram o programa. É certo que alguns países, com eleições à porta, não terão condições políticas para aceitar um alívio da dívida grega. Mas, cedo ou tarde, a Zona Euro terá que arranjar soluções que aliviem o peso da dívida na Grécia e noutros países: dos 19 membros da Zona Euro, só cinco têm uma dívida pública inferior a 60% do PIB e, dos restantes, oito têm uma dívida acima dos 90%. Este é um peso demasiado elevado para quem tem de crescer mais. Por isso, o que se está a passar rivaliza bem com o argumento do conhecido filme "Os deuses devem estar loucos".