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Maria tem 12 anos. Vivia com a mãe e com o padrasto, em Lisboa. Sofreu abusos sexuais do padrasto desde os 10 anos e está grávida de cinco meses. O predador já tinha antecedentes criminais pelo crime de abuso sexual de menores. Foi detido e aguardará julgamento na cadeia. A mãe, cúmplice do crime, seja por ação, seja por omissão, também foi constituída arguida, mas fica em liberdade.
Matilde tem 13 anos. Vivia com a mãe e com o padrasto, em Celorico da Beira. Sofreu abusos sexuais de um terceiro indivíduo desde os 11 anos e está grávida de sete meses. A menina seria obrigada pela mãe e pelo padrasto a prostituir-se a troco de dinheiro. O predador e a mãe de Matilde foram detidos e vão aguardar julgamento na cadeia.
Leonor tem 16 anos. Vivia com o pai (as notícias são omissas quanto à mãe), em Mangualde. Sofreu abusos sexuais do pai, de forma continuada, desde os 13 anos. O predador foi detido e aguardará julgamento na cadeia, depois de Leonor o ter denunciado a uma professora, na escola, e esta ter alertado a Polícia.
Os deputados da Assembleia da República serão hoje chamados a aprovar a lei do registo de pedófilos, que pretende melhorar a eficácia no combate ao abuso sexual de menores. Não chega a tempo de prevenir o sofrimento de Maria, Matilde e Leonor (os nomes são fictícios e escolhidos apenas por terem sido os três mais populares para nomear as meninas nascidas em 2014). A elaboração da "lista de pedófilos" terá também reduzida eficácia quando o crime acontecer no seio da família, como tantas vezes acontece e aconteceu a Maria, Matilde e Leonor. Mas isso não é motivo suficiente para a rejeitar.
A lei que suporta a criação de um registo de pedófilos é muito mais do que o folclore sobre se os pais podem ou não ser informados sobre a proximidade de um pedófilo. E também parece haver alguma ligeireza e exagero na previsão de futuros linchamentos públicos. O registo de pedófilos, que se prolongará no tempo bem para lá da pena já cumprida e que também incluirá os que já pagaram pelo seu crime, serve sobretudo para que as polícias possam fazer melhor o seu trabalho de prevenção e para impedir que um predador (por exemplo um professor ou um médico) volte a contactar com presas indefesas. Dizem-nos que os direitos constitucionais dos pedófilos (como os que atacaram Maria, Matilde e Leonor) estão a ser beliscados. É discutível. Em contrapartida, é indiscutível que o registo de pedófilos contribuirá para proteger os direitos constitucionais das 4638 Marias, 1997 Matildes e 1886 Leonores nascidas no ano passado.