Já muitos o fizeram mas vale a pena gastar ainda alguma cera com algo tristonho: o Orçamento de Estado para o próximo ano. O Dia D chegou. Isto é: deverá entrar hoje na Assembleia da República o projeto- bússola defendido pelo Governo para (des)orientar o país em 2013.
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Após as últimas semanas terem sido pródigas em anúncios do Executivo rapidamente substituídos por modelos de sentido contrário, numa clara demonstração de experimentalismo e falta de convicções num qualquer desígnio, já só sobram expectativas do domínio da psicanálise sobre o documento a entregar no Parlamento: a pen a depositar para a fotografia nas mãos de Assunção Esteves conterá a totalidade ou só uma parte dos mapas pelos quais o primeiro-ministro Passos Coelho e ajudantes entendem dever reger-se o país? Não haverá um qualquer lapso - suspeito, suspeito... - e o Parlamento corre o risco de receber várias das versões até aqui discutidas, mais ou menos TSU, mais ou menos IMI, mais ou menos escalões quantificados para efeitos de IRS, mais ou menos cortes sociais, mais ou menos emagrecimento da Função Pública, mais ou menos IRC e por aí fora?
As dúvidas pareceriam descabidas se não se desse o caso de o Governo funcionar sem rumo, como uma barata tonta, para mais dispondo da fama e do proveito de viver sob estilhaços no seu interior, os quais, não se resumindo ao estado comatoso da coligação, permitem alimentar facadas nas costas pela via da gestão do espaço público.
Nas suas variáveis de puro maquiavelismo e incompetência, o processo de construção do Orçamento de Estado para 2013 só tem mesmo, para já, uma garantia: em nome da redução do défice fará engrossar o naipe dos portugueses pobres, dizimando sobretudo a classe média. É dos livros: o aprofundamento da recessão fará multiplicar as falências e a taxa de desemprego. Fruto de subjugação e de défice de convicções políticas, o que se adivinha é um Orçamento de Estado feito de incoerências e impossível de cumprir, seja qual for a versão que hoje chegue à Assembleia da República. Não é necessário ser catedrático para perceber a impossibilidade de fazer encaixar as peças do puzzle de receitas e despesas plasmadas em folhas de excel a que falta a variável fundamental: o comportamento humano.
A dependência do financiamento exterior para fintar a bancarrota pode justificar uma parte da opressão económica e financeira do país; não serve é de explicação para a rápida e acentuada degradação de todos os patamares do poder inscritos no sistema político. E urge a regeneração.
Construído ao sabor do vento, o projeto de Orçamento de Estado a depositar hoje na Assembleia da República deveria ser encarado apenas como uma proposta, não documento acabado. Passível de introdução de modificações substanciais pelos 230 deputados da nação, incluindo os da maioria que apoia o Governo. Mas esse é mais um engano lamentável, como se verificará. Por regra os deputados apoiantes do Executivo e da oposição - os atuais como os anteriores - limitam-se a abanar a cabeça como os burros, obedecendo à voz do dono partidário de que dependem para existirem.
Por alguma razão esta República está de pantanas.