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Temos que nos curvar perante a evidência de que há políticos eleitos (por obra e graça dos eleitores) e políticos «eleitos» (por obra e graça, julgarão eles, da Divina Providência). À segunda categoria pertencem os que entendem que os fados lhes destinaram ser «diferentes» dos outros. Diferentes para melhor, pois! Como acontece na realeza, onde os lordes aceitam pairar, por nascimento, acima dos restantes cidadãos. Na república, a coisa consegue-se sendo-se eleito para qualquer lugar importante.
Deputado, por exemplo. Mas, se a palavra tiver um prefixo (euro), o «eleito» sente pertencer a uma elite ainda mais vasta, pois é acompanhada pelos «eleitos» de outros 26 países. E a maioria deles reagiu, com nítido sentido de corporação, à proposta (ou não seria antes à provocação?...) do eurodeputado Miguel Portas que sugeriu em Bruxelas que eles e os seus pares deviam voar em classe turística e não em 1.ª. A maioria votou contra (bem como à sugestão de congelar vencimentos e mordomias). Afinal, eles são os «eleitos», pertencem à raça dos novos senhores europeus, e como tal seria ultrajante obrigá-los a voar ao lado dos proletários do ar.
Não sei porquê, ocorrem-me recentes palavras do presidente da República: «os sacrifícios têm de ser repartidos por todos». Em igualdade de circunstâncias? Repartidos por igual entre os portugueses que mal têm dinheiro para transportes públicos e os eurodeputados portugueses que só querem voar em executive class e por isso votaram contra a proposta de Portas? Repartidos por igual entre quem recebe o salário mínimo e os quadros superiores da PT que, acaba de saber-se, o menos que amealharam em 2010 foi acima do milhão de euros? A resposta a estas dúvidas tem de ser negativa. Conformemo-nos: há os «eleitos» e os outros que não passam de eleitores. C'est la vie!...
