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Um padre e uma freira a beijarem-se, uma família a despedir-se de um ativista pelos direitos LGBTI vítima de sida, uma mulher negra a dar de mamar a um bebé branco, três corações inscritos com as palavras preto, branco e amarelo. "Para explicar certas coisas, as palavras não bastam". Foi com esta frase que a Benetton se despediu de Oliviero Toscani, o fotógrafo italiano que encontrou na publicidade uma forma de mostrar que a convivência entre pessoas de cor, credos e religiões diferentes é normal e contribui para a diversidade social.
Para o responsável pela publicidade da Benetton entre 1982 e 2000, as empresas têm a responsabilidade de mostrar "inteligência social e sensibilidade para com a sociedade à sua volta". O fotógrafo nunca quis agradar. Quis incomodar. Mas incomodar com um propósito.
Seria também esse o objetivo da polémica campanha da nova coleção de jeans da marca American Eagle, onde a atriz Sydney Sweeney (branca, loira e de olhos azuis) brinca com a semelhança fonética em inglês entre as palavras "jeans" e "genes", classificada como racista e sexista?
A campanha da American Eagle dificilmente se encaixaria nos critérios de Toscani. Não há um discurso político claro, nem uma provocação com uma função crítica. Há apenas um jogo com duplo sentido, apoiado numa figura mediática, que resulta mais em ruído do que em reflexão. Provavelmente foi mesmo esse o objetivo, porque a resposta seguiu o guião que conhecemos. Indignação nas redes sociais, hashtags de boicote, vídeos de denúncia.
A diferença entre provocar com consciência e provocar por provocar é clara. O que importa é alimentar os algoritmos num tempo em que a reação é mais valiosa do que a intenção.