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Portugal tornou-se numa sociedade bipolar do ponto de vista da distribuição da riqueza: de um lado, aqueles que ainda tiveram a sorte de apanhar o mercado imobiliário e as taxas de juro do crédito baratos; do outro lado, os jovens sem casa própria, em apartamentos partilhados ou que vivem em estado periclitante quando chega o fim do mês, já para não falar daqueles que ainda não conseguiram largar o ninho dos pais por manifestas dificuldades económicas.
Falemos do primeiro grupo. Não quero focar-me nos multimilionários. Refiro-me àqueles que nasceram no tempo certo. Mais de metade daquilo que se considera como sendo a riqueza das famílias é constituída por património imobiliário. A parte financeira representa apenas 49% das suas posses. É bem verdade que a crise inflacionista pós-pandemia levou a taxas de juro altas que colocaram muitos membros da classe média-média ou média-alta em sobressalto. Quanto mais ganhamos, mais gastamos. Tudo é relativo. No entanto, a riqueza patrimonial estava lá e tinha-se valorizado muito nos anos anteriores. Na realidade, a casa própria foi sempre uma boia de salvação: em caso de necessidade absoluta, o imóvel era (e ainda é) um bem muito valorizado.
O segundo grupo, o dos jovens aflitos, pode ser decomposto entre os trabalhadores por conta de outrem mal pagos e os recibos verdes, uma realidade bem retratada hoje pelo JN. São 500 mil e ganham em média 541 euros, numa altura em que o salário mínimo está à beira de saltar para os 870 euros (2025). Havia cerca de metade dos precários há dez anos. E o que mais aconteceu nesse espaço de tempo? Refiro apenas um exemplo: o preço médio de uma habitação “duplicou em dez anos”, segundo a consultora CBRE.