<p>Uma das questões mais interessantes que sai das eleições de domingo tem a ver com os limites da acção governativa. Na hora da vitória, quer Paulo Rangel quer Manuela Ferreira Leite foram rápidos a clamar que o Governo perdera legitimidade para algumas decisões, sobretudo para as que possam hipotecar o futuro. Esta mesma expressão "hipoteca do futuro" foi arma usada por Manuela Ferreira Leite, durante a campanha, para se referir a grandes obras projectadas pelo Governo, nomeadamente o novo aeroporto de Lisboa, o TGV e uns quantos quilómetros de auto-estrada previstos pelo Executivo. É isto que está em causa. Queira o Governo avançar com novas escolas ou unidades de saúde e, possivelmente, não encontrará acusações de falta de legitimidade por parte do PSD. </p>
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A verdade é que o Governo foi eleito por um período determinado de tempo e tem, durante esse período, toda a legitimidade para governar. O que o Governo perdeu com os resultados de domingo não foi essa legitimidade, obviamente. Mas ficou, em contrapartida, para seu mal, com algum condicionalismo político que resulta, em simultâneo, do mau resultado e da proximidade das eleições legislativas. Mas não perdeu legitimidade. Tivessem as Europeias decorrido a meio da legislatura e ninguém suscitaria tal questão.
É óbvio, agora, que o Governo precisa de uma dose grande de bom senso e sobretudo da humildade que lhe terá faltado até aqui. Em seu próprio interesse, não deve tomar hoje decisões que podem esperar três ou quatro meses por um novo Governo, sem prejuízo para o país. É por isso também que o PSD deve rapidamente dizer o que fará e não fará se for chamado a formar Governo, porque o cidadão eleitor necessita, nos próximos meses, de perceber a diferença de propostas para poder avaliar a quem deve dar o seu voto.
P.S. 1 - Uma matéria que tinha reunido um amplo consenso - a unanimidade parlamentar falhara por um voto - morreu em Belém, com o veto de Cavaco Silva à lei do financiamento dos partidos. Um bom serviço à democracia.
P.S. 2 - A tolerância em democracia quer-se vasta, mas não tanto que permita a milhares de polícias, cidadãos com responsabilidades específicas, chamarem mentiroso ao primeiro-ministro do país.