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Não são necessários conhecimentos aprofundados das teorias da comunicação para saber que a um estímulo provocado por uma determinada mensagem jornalística não corresponderá automaticamente uma resposta daqueles que a recebem, o que subtrai aos conteúdos noticiosos força para se constituírem como uma espécie de balas mágicas, capazes de moldar opiniões. Todavia, o fluxo informativo não é inócuo, ainda que não tenha o poder que muitos lhe atribuem. É fundamental levar isso em conta em contextos eleitorais, particularmente aqueles que mais parecem estar próximos do Inferno, como os que hoje se vivem nos Estados Unidos.
Os média não elegem miraculosamente um presidente, nem tão pouco conseguem aniquilar previamente qualquer vitória nas urnas. Se tal acontecesse, Dilma Rousseff nunca teria subido duas vezes a rampa do Planalto. Nas últimas eleições, a candidata do PT enfrentou estoicamente um forte posicionamento editorial contra si e, mesmo assim, conseguiu reunir os votos necessários para ser eleita. Não foram os média que a derrubaram. Foram os políticos, embora certos meios de Comunicação Social tenham contribuído para essa queda, promovida pela Câmara dos Representantes. Por estes dias, nos Estados Unidos, os principais órgãos de Comunicação Social erguem poderosas barreiras contra Donald Trump, mas o candidato republicano tem conseguido subir nas intenções de voto, embora as sondagens valham muito pouco...
Foram em massa as declarações de apoio editorial a Hillary Clinton. Mesmo os jornais que tradicionalmente se colocam ao lado dos republicanos mudaram de rumo e aqueles que insistiam em manter-se equidistantes das eleições abriram uma exceção. "O nosso apoio fundamenta-se no respeito pelo intelecto, experiência e coragem, visíveis numa carreira de serviço público quase contínua, muitas vezes como a primeira ou única mulher na arena", escreve "The New York Times". Há quase um século a apoiar o Partido Republicano, "The Cincinnati Enquirer" sustenta a candidata democrata com o seguinte argumento: "Esta não é uma corrida tradicional e estes não são tempos tradicionais. Precisamos de um líder que traga o melhor a todos os americanos. Não o pior." O jornal "The Dallas Morning News" fez idêntica opção: "Não chegamos a essa decisão com facilidade. Este jornal não recomenda um democrata para o mais alto cargo da nação desde a Segunda Guerra Mundial". Fê-lo agora. Também "The Washington Post, "Los Angeles Times"... e muitos outros posicionaram-se ao lado de Clinton. Percebe-se que vários títulos não revelam grande entusiasmo em relação a Hillary Clinton, mas sente-se o seu temor perante uma vitória de Donald Trump.
E o que vale este colossal apoio mediático? Alguma coisa, é certo. Todavia, não determina a derrota de ninguém. Porque o fluxo de comunicação desdobra-se em várias etapas e nele pode integrar-se um gigantesco conjunto de atores (veja-se o estrago que o diretor do FBI provocou nos democratas ao divulgar uma investigação a Hillary Clinton) e porque, acima de tudo, os recetores das mensagens não são massas amorfas que absorvem acriticamente aquilo que é difundido. São, antes, públicos ativos que consomem e produzem continuamente conteúdos que ninguém é capaz de controlar, construindo em permanência juízos de valor sobre a informação que absorvem. É neste complexo ambiente mediático, onde os jornalistas perderam o monopólio de selecionar e produzir informação, que políticos e eleitores se movimentam.
É claro que os média continuam a ter um enorme poder para promover agenda-setting, ou seja, para marcar os temas sobre os quais o debate se faz: não dizem como pensar, mas dizem continuamente no que pensar e, a partir disso, ergue-se um certo condicionamento das perceções sociais sobre os políticos em cena. Também é verdade que os cidadãos têm horror das espirais do silêncio e sentem-se tentados a aproximar-se de opiniões dominantes... Mas, até ao dia 8 de novembro, muita coisa poderá acontecer e, o que é mais assustador, muito poderá ainda estar para vir depois do dia 8. Porque nos EUA tudo será muito imprevisível.
PROF. ASSOCIADA COM AGREGAÇÃO DA UMINHO