Os médicos e a ética da eficiência
Corpo do artigo
Num tempo em que os recursos na saúde são cada vez mais limitados, a eficiência deve deixar de ser vista apenas como um conceito económico e passar a ser assumida também como um valor ético essencial na prática médica. Durante demasiado tempo, este princípio foi desvalorizado pelas profissões liberais médicas, habituadas a pensar sobretudo em termos de autonomia técnica e do cuidado individual. No entanto, a realidade dos sistemas de saúde exige uma mudança de paradigma.
De acordo com a OCDE, eficiência significa obter os melhores resultados possíveis com os recursos disponíveis. Na saúde, isso pode passar por duas vias: reorganizar a forma como os recursos são distribuídos (eficiência alocativa) ou alcançar os mesmos resultados com menor custo (eficiência produtiva). Em qualquer dos casos, está em causa a sustentabilidade do sistema e a justiça na sua gestão.
Nenhum país do Mundo, independentemente da sua riqueza, consegue financiar todos os cuidados de saúde para todas as pessoas, em todas as circunstâncias. Torna-se, por isso, necessário definir, de forma transparente e participada, quais os cuidados básicos que a sociedade pode assegurar publicamente a todos os cidadãos. Este exercício envolve escolhas éticas difíceis – e é aí que a eficiência entra como critério de justiça.
As profissões liberais médicas têm um papel único neste processo. Pelo seu conhecimento especializado, pela responsabilidade individual que assumem, pela autonomia técnica e pelos códigos éticos a que obedecem, são um pilar fundamental na confiança que sustenta o sistema de saúde. Mas essa posição exige também um compromisso renovado com a responsabilidade social e com a gestão sensata dos recursos.
A compatibilização entre a tradição humanista da medicina e os desafios contemporâneos – nomeadamente a sustentabilidade e a equidade no acesso – obriga à inclusão da eficiência como valor ético na prática clínica. Isso não significa tratar a saúde como uma fábrica de números, mas sim garantir que cada decisão clínica respeita a dignidade dos doentes e, ao mesmo tempo, contribui para a proteção de um bem comum: o sistema de saúde de todos.
A ética do cuidado e a ética da eficiência não são opostas. São, na verdade, complementares. Ambas colocam o doente no centro, mas com a consciência de que cuidar bem de um é, também, não esquecer todos os outros.