A hipótese de alternância é virtude consagrada pelas regras da democracia e obedece, em movimentos cíclicos, a eleições para as quais uma espécie de contagem de espingardas prévia perfila candidatos ao Poder, primeiro nas várias fileiras de decisão político-partidária e só depois no cruzamento de opções ideológicas para atribuir a governação do país.
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Tudo estaria nos conformes se não se registasse demasiadas vezes em Portugal o processo eletivo no âmbito partidário estar marcado por comportamentos vergonhosos e para os quais críticas e denúncias desejáveis são, regra geral, substituídas por silêncios cúmplices. O problema seria do foro do caciquismo muito localizado - e inócuo - não se desse o caso de duas ou três centenas de milhares de militantes dos partidos políticos decidirem o futuro coletivo de quase dez milhões de portugueses....
Cumprindo calendários previamente definidos, a agitação eleitoral dos últimos dias em torno de concelhias do Partido Socialista - como noutras ocasiões com o CDS ou o PSD - são paradigmáticas do baixo nível de discussão e comportamento assumido por alguns dos protagonistas. As notícias em torno do pagamento massivo por um único soba de quotas de militantes (até mortos!), tratando-os em manadas na gestão do sindicato de votos é, claramente, exemplo acabado de como é urgente um combate sério e profundo aos golpes palacianos. Somem-se-lhe as cenas de quase faca e alguidar entre alguns candidatos e eis-nos num quase grau zero da política.
Os casos recentes não são exclusivos do Partido Socialista, note--se. Dão apenas uma mais notória visibilidade à descredibilização por que passam os partidos políticos, fruto de estarem entregues quase sempre a gente de poucos escrúpulos, nenhuma memória e muita vontade de fazer pela vida - a própria, não a da globalidade dos cidadãos.
Não há, com certeza, uma varinha de condão capaz de combater a um só tempo a troca de competência pela mediocridade sedimentada na militância partidária. Tal não invalida a necessidade de adoção de critérios de maior exigência, rompendo os vícios do atual sistema de escolhas. Algo tanto mais longínquo de suceder quanto as lideranças assobiam para o lado e são incapazes de verberar em público os ensaios - quando não a efetividade - de chapeladas próprias do totalitarismo.
Os partidos políticos, para todos os efeitos, são essenciais a qualquer democracia e devem dispensar que as suas práticas sejam as primeiras a colocar o regime em risco, seja por cavarem um fosso cada vez maior com o eleitorado seja por abrirem espaço ao surgimento possível de populistas.
É preocupante não haver quem reaja com eficácia aos sucessivos sinais de distanciamento do povo dos partidos políticos, tentando invertê-los. A continuidade das más práticas, o alimentar de aparelhos sem qualquer predicado ético, não augura nada de bom. Embora possa parecer o contrário, os próprios caciques dos aparelhos partidários acabarão, mais cedo do que tarde, por serem triturados por aventureirismos para os quais só uma fórmula será capaz de os evitar: mais e mais credibilidade da classe política.