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Costumo visitar escolas, sobretudo do Ensino Secundário, para falar de leitura, livros e da vida que a literatura mostra. Encontro adolescentes como eles sempre foram, iguais ao que eu fui: atados. Sei que a adolescência é um nó que se desata com o tempo - e que a natureza humana é imutável, empedernida, a mesma agora e antes. Mas também sei que as circunstâncias a balanceiam para o melhor ou para o pior de si mesma.
Pelos corredores, adolescentes crescidos na covid e em plena sujeição digital lá interagem em grupo. Alguns tímidos, outros ansiosos - impossivelmente ansiosos -, outros infantis, todos mais ou menos esperançosos e com medos e problemas que sempre surgiram nessas idades, pelo menos desde que a adolescência foi inventada. Mas agora interagem ainda mais tímidos - insuportavelmente ansiosos -, e com medos e problemas que surgem por causa do smartphone, que não é um instrumento de comunicação. É um instrumento de submissão.
Nas aulas, dizem-me os professores, os alunos mal conseguem aguentar dez minutos sem buscarem os telemóveis, por vezes discretamente, mas por norma sem pudor, como se acudissem a uma necessidade urgente. A necessidade urgente de coisa nenhuma: aliás, todos a sentimos - o telemóvel atrai-nos, precisamos de estar junto dele para sermos consumidos.
Tal dependência ainda é maior entre os adolescentes, não só pelas circunstâncias em que cresceram (online até ao osso), mas porque o apelo digital, aquela aparência de ligação, de integração num todo onde talvez encontrem um sentido, é ainda mais sedutora em pessoas sós. E nunca conheci um adolescente que não enfrentasse algum tipo de solidão.
Vivem sós e patológicos: pelo menos desde a covid, mais e mais alunos precisam de acompanhamento especial, de alguém que lhes dê a mão, que lhes explique os enunciados, que fique com eles à parte nos exames porque não aguentam a ansiedade. Mais e mais se queixam, com os pais sempre a pairar, de alguma dificuldade psicológica específica, só deles. É a geração da fobia.
Não tenho qualquer dúvida de que, havendo tantas outras causas, metade do problema está nos ecrãs. E que, sobretudo nas escolas, se trata de uma crise de saúde pública parecida com a do tabaco. A proibição do uso de telemóvel só peca por tibieza: devia ser alargada a todos os níveis de ensino de forma radical e sem complacências.
Mas duvido que aconteça: na semana passada, o ministro da Educação anunciou que queria dar a cada aluno um tutor "que ouve, orienta e inspira a aprendizagem". Lá imaginei que se tratasse de um professor, mas isso parece coisa do passado. Cada aluno precisa de um tutor de inteligência artificial. Sim, a adolescência é um nó que se desata com o tempo. Mas convém não o apertar.
O autor escreve segundo a antiga ortografia

