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No meio da turbulência internacional, abalada que parece estar a grande estrutura atlântica em que a Europa alicerçou a sua defesa e espaço de cooperação, temos em Portugal uma crise política desnecessária.
Desnecessária porque resulta de uma estranha fuga para a frente de um Governo, ou melhor, de um primeiro-ministro que recusou fixar a si mesmo as regras de transparência e de ética política que advogaram enquanto Oposição.
Num tempo de narrativas e de perceções, ou seja, de construção de máscaras sobre a verdade, importa registar de quem é a responsabilidade desta crise. Por mais que tentem impor leituras de vitimização, essa responsabilidade tem um dono evidente.
Brincar às crises políticas, num “mix” de utilização oportunista dos instrumentos democráticos e de manipulação comunicacional, pode ser útil para esconder falhas éticas, falhas de governação e falhas de compromisso com os portugueses. Mas é um caminho perigoso de fomento da descrença das pessoas na democracia e é um favor feito aos populismos.
Esta é, talvez, a primeira crise populista da nossa democracia, ou seja, assistimos à utilização pelo Governo das técnicas populistas para um jogo de preservação do poder pelo poder.
A campanha eleitoral que se inicia não pode alinhar nesta estratégia. É preciso que os temas essenciais para o país e para os portugueses não fiquem esquecidos e embrulhados na espuma da vida empresarial ou pessoal de um dos candidatos.
Os portugueses assistiram no último ano à degradação dos serviços de saúde (que, recorda-se, seriam “salvos” em 60 dias), ao agravamento da crise da habitação e a um perigoso alinhamento do Governo com o discurso securitário da extrema-direita.
Ao país foi negado, logo nos meses iniciais de governação, o caminho do combate ao centralismo que tem atrofiado o desenvolvimento do país e é responsável por tantas desigualdades sociais e territoriais que nos afetam e nos afastam dos padrões europeus. Negar a regionalização não foi uma inocente opção ideológica, foi querer manter centralizado o que se deseja privatizar, dando em troca aos portugueses serviços essenciais mais débeis, como se viu, por exemplo, no caso dos CTT.
No espaço deste artigo não é possível esgotar os temas fundamentais para o país que devem marcar esta campanha eleitoral.
Deixo esse apelo à sensatez, ao realismo, ao imperativo de pensarmos o país. Porque os portugueses e Portugal não podem ser temas adiados em favor dos oportunismos políticos.