Os três Rs de um sistema adequado de transporte de massas: o caso do Metro do Porto
Corpo do artigo
Qualquer sistema de transporte de massas adequado, num espaço urbano, segue sempre três Rs: rapidez, regularidade e reconforto na sua operação.
Ou seja, consegue ser o meio de transporte mais rápido ou equiparavelmente rápido ao modo automóvel particular; é um meio de transporte pautado por uma previsível e regular frequência de passagem e, por fim, é um meio de transporte seguro, agradável e que reconforta os potenciais utentes na decisão de o utilizar, por contraponto ao seu automóvel.
Neste contexto, e em muitas situações, o Metro do Porto é pautado pela excelência nestes três Rs, oferecendo uma oferta de transporte rápida, regular e reconfortante para o utente.
Porém, e se olharmos em pormenor para a rede total, verificamos que o Metro do Porto falha em muitos destes aspetos, o que contribui para a falta de atratividade de muitos dos seus troços e para uma ainda elevada resistência dos habitantes da Área Metropolitana do Porto no que diz respeito a trocar o seu automóvel por este transporte público.
Em primeiro lugar, e com a exceção do tronco comum e dos percursos subterrâneos da Linha Amarela, o Metro do Porto falha no R da "rapidez" nos troços de maior concentração populacional da sua rede.
Tomando por base os dados operacionais mensais mais recentes disponibilizados no seu site de fevereiro de 2021, destacam-se, de forma imediata, as seguintes estatísticas, no que diz respeito à velocidade média:
- Rio Tinto - Levada (Gondomar): ~17 km/h;
- Matosinhos Sul - Brito Capelo (Matosinhos): ~15 km/h;
- João de Deus - Câmara Gaia e General Torres - Jardim do Morro: 16 km/h.
É verdade que o Metro do Porto, sendo uma derivação de um Light Rail Transit (LRT) não irá apresentar, obviamente, as velocidades médias típicas de um comboio suburbano ou mesmo de um Heavy Rail Transit (HRT), tendo em conta que este, apesar de circular num canal dedicado, partilha o espaço urbano com automóveis e peões. Por esta mesma questão, o Metro do Porto tem de circular a velocidades mais baixas, por forma a minorar potenciais acidentes com viaturas ou mesmo atropelamentos de a peões.
No entanto, e apesar das baixíssimas velocidades médias acima referidas, ao nível de uma trotinete elétrica, continua a ser verdade que Rio Tinto, Matosinhos e Vila Nova de Gaia são pontos negros da operação do Metro do Porto onde, todos os anos, se verificam atropelamentos (e em alguns casos, mortais) e acidentes com viaturas nos cruzamentos com o canal metroviário.
Ora, a maior parte dos atropelamentos justificam-se por atravessamentos da linha pelos peões fora dos respetivos cruzamentos indicados para o efeito, tendo em conta que a única descontinuidade a separar o canal metroviário do restante espaço público costuma ser, na rede do Metro do Porto, um relvado de largura reduzida ou nenhuma descontinuidade nem desnível entre o canal do metro e os passeios se verifica.
Tal é o caso no centro da Maia, na Rua Brito Capelo em Matosinhos ou mesmo em Jardim do Morro, em Vila Nova de Gaia, e na Ponte D. Luís I, não havendo assim elementos dissuasores para atravessamentos ilícitos da linha.
Naturalmente, a resposta natural aos sucessivos atropelamentos e colisões com viaturas seria uma maior segregação do canal metroviário, mediante gradeamentos ao longo das laterais do canal para dissuadir e, até mesmo, suprimir tais atravessamentos.
Contudo, o que se verificou foi mesmo uma redução das já baixas velocidades comerciais do Metro do Porto para reduzir (escolhe uma) as distâncias de travagem dos veículos do Metro, o qual é ineficaz, atendendo ao peso das carruagens, e representa um óbice para uma operação comercial com tempos de viagem competitivos.
Assim, e passados 20 anos de operação comercial com cada vez maior procura potencial deste sistema de transporte, urge segregar o canal metroviário onde este não se encontra devidamente segregado e aumentar as velocidades comerciais com vista a que estas se aproximem da velocidade média típica de um LRT de 27 km/h, promovendo também uma melhoria na rotação do material circulante.
Em segundo lugar, temos o segundo R, "regularidade", onde o Metro do Porto falha também nos seguintes aspetos.
A este título, embora o tronco comum e a Linha Amarela possuam, nos dias úteis e em hora de ponta, frequências de 4 e 6 minutos respetivamente, o cenário é diametralmente oposto para as demais linhas, com frequências de 15 minutos ou, mesmo até, de 30 minutos para serviços para o ISMAI, na Maia, ou os serviços Expresso da Linha Vermelha, dissuadindo, naturalmente, a utilização destes serviços.
O cenário piora de figura ao fim de semana, com a supressão total dos serviços Expresso da Linha Vermelha e com frequências de 10 a 15 minutos na principal linha da rede, a Linha Amarela, frequências típicas de um serviço ferroviário suburbano.
Por último, cumpre apontar o R de "reconforto" aos utentes na hora de decidir trocar o automóvel por este transporte público que é, sem dúvida, o calcanhar de Aquiles do Metro do Porto.
Ora, a rede do Metro do Porto é uma rede composta por 82 estações, das quais 61 estações, ou cerca de 75% da rede, possui apenas um abrigo que é mais pequeno que muitas paragens de autocarro e onde cabem, devidamente abrigadas, não mais do que 15 pessoas. Isto, apesar do Metro do Porto poder transportar 490 pessoas no máximo, ou 32 vezes mais.
Assim, apenas 21 estações são subterrâneas ou, sendo à superfície, privilegiam os utentes com uma cobertura integral da plataforma, protegendo estes dos elementos numa das cidades mais chuvosas do país.
Neste sentido, urge reformular estas estações à superfície no sentido de adotarem uma cobertura integral da plataforma, no sentido de proporcionar melhores condições de espera aos utentes, principalmente quando as frequências de passagem não são as desejáveis. Um bom exemplo é a estação Hospital S. João, já alvo dessa reformulação. Faltam as outras 61.
Posto isto, entende-se a dificuldade de muitos poveiros, vilacondenses, matosinhenses, maiatos, gondomarenses, gaienses e até mesmo portuenses em conseguir trocar o seu automóvel próprio pelo Metro, que muitas vezes não é rápido, muitas vezes não é frequente e muitas vezes não reconforta os utentes nos dias em que as condições climatéricas não são as ideiais.
Passados 20 anos desde a entrada em operação deste excelente meio de transporte, cumpre corrigir o que não está bem, para que o Metro do Porto seja a referência em Portugal em termos de transporte público e não apenas uma nota de rodapé da segunda maior cidade do País.
*Economista