Diga-se bem...São raros, mas ainda há portugueses capazes de manifestar bom senso. Dispõem de um problema: a sua capacidade de intervenção é limitada e acabam por não influenciar tanto quanto seria desejável a vida coletiva do país.
Corpo do artigo
Silva Peneda, presidente do Conselho Económico e Social (CES), integra esse curto naipe de cidadãos nacionais de pensamento estruturado. Por regra, as suas intervenções são ponderadas, clarificadoras, não trocam a coerência por ziguezagues taticistas. E um comportamento assim consegue pelo menos a obtenção de pontes de diálogo entre partes desavindas, embora depois tudo fique encalhado.
Sob a liderança de Silva Peneda, o CES tem sido, de facto, um fórum tipo válvula de escape de tensões e de hipótese de diálogo entre parceiros sociais. Não fosse a sua paciência associada a um vinco de tolerância e outro galo cantaria no país - até pelas sucessivas afrontas feitas a associações patronais e confederações sindicais por um Governo arrogante e incapaz de desalinhar da ementa de austeridade fornecida pela troika.
Quando Silva Peneda refere, por exemplo, e como o fez ontem, que "a competitividade não pode ser feita à custa da redução salarial" está, com certeza, a exprimir algo do senso comum. E daí? O que sobra de um dito assim? O ideal seria a ponderação efetiva, mas não; quem tem o aparente poder de decisão nacional tem tudo alinhadinho pelo cardápio da assistência prestada pelo BCE, Comissão Europeia e FMI; limita-se a atirar para as calendas cenários cuja razoabilidade deveria ser inquestionável - como o aumento do salário mínimo. Haja, então, uma virtuosa paciência à Silva Peneda, até para a boa vontade encenada pelo primeiro-ministro, Passos Coelho, de se sentar ontem à mesa da Concertação Social em nome da obtenção de uma coesão nacional há muito perdida. Assim como assim......
Passemos ao contraponto, já que dizer mal é o prato do dia....
O relatório do FMI sobre a 8.ª e 9.ª avaliações ao programa de assistência é paradigmático de como o país está num beco sem saída. Para quem tivesse dúvidas, o chefe de missão, um tal senhor Subir Lall (nasceu na Índia, uma nação de trabalho a troco de uma côdea e zero de modelo social), foi claro sob os próximos passos exigidos a Portugal: mais austeridade, isto é, mais miséria.
Entre muitas outras alíneas destinadas a acentuar o nosso empobrecimento, o FMI, claro, aponta a mais flexibilização dos salários e, hélas!, ao alinhamento de incentivos para disputar despedimentos em tribunal! Uma via aterradora...e com uma quadratura do círculo do entretenimento: consolidação vs. crescimento da economia, diz Subir Lall.
O protetorado, como gosta de enfatizar Paulo Portas, vai continuar a obedecer? Está ainda longe o cenário do fim do resgate (o primeiro) e hipótese de repetição do 1640 de que há dias Paulo Portas também se mostrou crente. Há que ponderar todas as vias. O Miguel de Vasconcelos do século XVII acabou morto e atirado por uma janela.