A Bertrand promove todos os anos um concurso em que os portugueses podem escolher a palavra do ano. Para isso, divulga 10 palavras finalistas que seleciona "através da análise de frequência e distribuição de uso das palavras e do relevo que elas alcançam, tanto nos meios de comunicação e redes sociais como no registo de consultas online e mobile dos dicionários da Porto Editora".
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E é curioso ver como na dinâmica e criatividade da língua portuguesa se espelham, com meridiana clareza, as preocupações de todos nós e, ainda assim, a natureza sobrevivente e otimista do ser humano.
As palavras (10) foram listadas por ordem alfabética para não influenciar a escolha mas ordenam, de forma vívida, a nossa relação com o exterior, com o nossa vida coletiva e ainda com a essência do Mundo pós-moderno que pendula entre o tecnológico e o regresso às origens, entre as preocupações cívicas e a vontade de dançar.
Acolhimento; Refugiados; Terrorismo: o tema dos temas. As três palavras espelham a vontade de ajudar, a solidariedade com essa nova espécie de migrantes que logo se transforma em medo de acolher quem nos pode matar.
Plafonamento; Privatização; Esquerda. O medo de não ter dinheiro para a velhice ou a zanga de ver rasgado um contrato social que se julgava de "palavra de honra". A noção de que se vão os anéis e os dedos. A esperança de uma viragem que pode redistribuir ou o medo de não haver nada para distribuir.
Festivaleiro; Bastão de selfie; Drone; Superalimento. Um Mundo pós-moderno que afoga o individualismo em manifestações coletivas mediáticas e psicopátrias, um Mundo voyeur e anónimo, um Mundo egocêntrico em que as fotos têm sempre de me ter em primeiro plano, mais de perto ou mais de longe. Um Mundo que se esgota na depuração do que é mais saudável sem perceber que o superalimento não nasce da natureza porque esta já quase se esgotou.
A que palavra se renderão os portugueses? Faço votos para que, tudo somado, se possa deitar para trás das costas a negritude das ameaças externas e a tensão azeda da política interna e que entre os superalimentos e os supergadgets se escolha o festival onde pelo menos nos vemos uns aos outros e ainda nos mexemos numa dança saudavelmente irresponsável e temporariamente feliz.