Habitualmente os poderes instituídos não lideram as revoluções. Não foi assim com João XXIII, que lançou o concílio Vaticano II. E não está a ser assim com o Papa Francisco.
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O Papa tem aproveitado o discurso à Cúria Romana, antes do Natal, para tecer duras críticas ao seu funcionamento. Foram discursos em que disse o que queria ver corrigido no seu funcionamento e onde foi desenhando a sua reforma. Este ano, no sábado, na Sala Clementina do Vaticano, para além de acolher as saudações natalícias e desejar boas-festas aos membros da Cúria, teve palavras menos críticas, mas urgiu com ainda maior veemência uma mudança na Igreja.
O Papa recordou as palavras do cardeal Newman, que dizia: "Aqui, na terra, viver é mudar; e a perfeição é o resultado de muitas transformações". Para o Papa é claro que a Igreja precisa de mudar. Sobretudo neste momento histórico em que se vive, "não simplesmente uma época de mudanças, mas uma mudança de época". Não se trata de mudar por mudar, ou de "seguir as modas, mas de ter a convicção de que o desenvolvimento e o crescimento são a característica da vida terrena e humana".
Para além disso a Igreja já não vive, como antes, em tempos de cristandade, "porque a fé - especialmente na Europa, mas também em grande parte do Ocidente - já não constitui um pressuposto óbvio da vida habitual; na verdade, muitas vezes é negada, depreciada, marginalizada e ridicularizada". Reconheceu ainda que "hoje já não somos os únicos que produzem cultura, nem os primeiros nem os mais ouvidos". E pediu "uma mudança de mentalidade pastoral".
Neste novo contexto é exigida à Igreja - e em particular à Cúria Romana - uma postura mais missionária. Esta consiste, não só no anúncio do Jesus Cristo, mas também na promoção do "desenvolvimento integral do homem à luz do Evangelho". Isto, para o Papa, concretiza-se "no serviço aos mais frágeis e marginalizados, em particular aos migrantes forçados, que representam neste momento um grito no deserto da nossa humanidade". A Igreja "está chamada a despertar consciências adormecidas na indiferença perante a realidade do mar Mediterrâneo que se tornou para muitos, demasiados, um cemitério", disse o Papa.
A mudança, sobretudo num corpo como a Igreja, não é fácil. E o Papa está consciente disso. Por isso alertou para a tentação de assumir a atitude da rigidez: "Esta nasce do medo da mudança e acaba por disseminar estacas e obstáculos pelo terreno do bem comum, tornando-o um campo minado de incomunicabilidade e ódio".
No final do discurso, o Papa apelou à mudança com as palavras do cardeal Martini: "A Igreja ficou atrasada 200 anos. Como é possível que não se alvorace? Temos medo? Medo, em vez de coragem? No entanto, a fé é o fundamento da Igreja. A fé, a confiança, a coragem. (...) Só o amor vence o cansaço".
E concluiu: "O Natal é a festa do amor de Deus por nós. O amor divino que inspira, dirige e corrige a mudança e vence o medo humano de deixar o "seguro" para se lançar no "mistério"".
Um Feliz Natal para todos!
Padre