Os portugueses deixaram de acreditar nos políticos, e nas políticas, e saíram à rua por não conseguirem vislumbrar qualquer luz ao fundo do túnel. A perda de poder de compra, a instabilidade no emprego, o receio relativamente ao futuro, conduziram-nos a este estado de alma, a este desânimo que percorre todos os setores da nossa sociedade. Há um sentimento generalizado de que por cada sacrifício que é pedido, e que nos vemos na obrigação de aceitar, há outro qualquer que vai sendo congeminado nos gabinetes, pelos "advisers" que se especializaram no experimentalismo, e que parecem não saber que a economia é uma ciência social, e que os cidadãos não são ratinhos brancos.
Corpo do artigo
Tudo isto decorre, como se sabe, de uma situação particularmente adversa. Vivemos numa situação de dependência externa, debaixo de uma tutela de credores que, a troco de transfusões regulares, nos obrigam a um tratamento de choque que não parece estar a resultar. Sucede, contudo, que a saída desta crise passa pelo crescimento económico, e este só pode ser conseguido, no atual contexto recessivo, através dos mercados externos.
A ser assim, impunha-se então que os nossos governantes olhassem, com particular atenção e carinho, para a nossa região, que tem tradicionalmente um saldo comercial positivo e empresas que garantem esse objetivo, mas que, apesar de serem bem geridas, porque as que eram mal geridas há muito que soçobraram, de terem trabalhadores dedicados, de terem um bom produto, de terem uma boa carteira de clientes, lutam, ainda assim, pela sobrevivência. A falta de liquidez e os custos de contexto são, nesses casos, os fatores críticos que impedem o seu crescimento e, em alguns casos, ameaçam a sua sobrevivência.
Ora, sendo evidente que vivemos uma crise muito séria, e estando o país ainda numa situação de emergência, a verdade é que o futuro, em termos de crescimento económico e de criação de emprego, depende, antes de mais, da sobrevivência e do crescimento destas empresas que produzem bens transacionáveis. Trata-se, para além do interesse nacional, de uma questão de justiça.
Não foram estes empresários, nem esses trabalhadores, que levaram o país até à borda do abismo. E, ao contrário do que acontece no Estado, essas empresas não podem cobrar mais impostos aos portugueses quando não faturam o suficiente, ou quando acumulam défices; esses trabalhadores não têm grandes regalias, nem têm emprego garantido para a vida. Por isso, por imperativo nacional, e em nome do famoso princípio de equidade que outros perverteram, deveriam estar no topo da agenda.
Não se exige, obviamente, que se subsidiem as atividades privadas: esse é um modelo injusto e inexequível. O setor privado não pode depender de subsídios ou de ajudas do Estado.
Precisa, no entanto, que o Estado não lhe crie constrangimentos, e que as políticas públicas, nas suas várias vertentes, contribuam para facilitar as suas iniciativas, equiparando os seus custos de contexto aos seus concorrentes internacionais. O que se faz através de políticas concretas, que têm de ser trabalhadas no terreno, e da proteção dos instrumentos indispensáveis para que essas empresas consigam ganhos de produtividade.
Para isso, é necessário que a banca comercial, que hoje depende das ajudas do Estado, adote critérios, na concessão de crédito que se adequem às prioridades macroeconómicas do país. Sem esse condimento, fundamental para o investimento produtivo nas empresas, seja na compra de equipamentos que garantam o aumento de produção e a modernização tecnológica, seja no apoio de crédito às exportações, as empresas não poderão crescer. É necessário, também, uma política fiscal com um sentido idêntico. E, se o Estado pode fazer alguma coisa, através das políticas fiscais, deveria então fomentar a retenção de lucros na empresa com o objetivo de reforçar os capitais próprios e financiar os investimentos; medida essa que, sendo socialmente aceitável, pode ajudar à criação de emprego e ao crescimento económico nas empresas saudáveis.