Os resultados da primeira volta das eleições presidenciais francesas agradaram certamente aos mercados financeiros internacionais: no dia seguinte, as ações cotadas em bolsa subiram e os juros baixaram!
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O candidato independente Emmanuel Macron - que reclama estar acima da divisão política tradicional entre Direita e Esquerda - conquistou o primeiro lugar desta primeira etapa da corrida. Também Marine Le Pen tem bons motivos para ficar satisfeita. A candidata do partido da extrema-direita que se propõe fechar as fronteiras, abandonar o euro e negar asilo aos refugiados, também passou à segunda volta e - embora sejam muito escassas, felizmente, as probabilidades de vencer - tem a oportunidade de prosseguir na sua cruzada contra os imigrantes que indiscriminadamente qualifica como potenciais criminosos e de continuar a exigir medidas ainda mais musculadas para o combate aos terroristas internacionais que deliberadamente confunde com o islão.
Pelo contrário, aos socialistas franceses poderá estar reservado um destino semelhante ao dos socialistas gregos: a desagregação. O candidato socialista, Benoît Hamon, vencedor das eleições primárias, obteve uns miseráveis 6% na primeira volta das presidenciais, com um resultado humilhante. À Direita, François Fillon encalhou nos escândalos por suspeita de favorecimento indevido da mulher e dos filhos e ficou também excluído da corrida, quase empatado com um dos candidatos da Esquerda, Jean-Luc Mélenchon. Em consequência, nenhum dos dois principais partidos franceses - o PSF e Os Republicanos - estará representado na etapa final pela disputa da presidência que termina dentro de duas semanas.
Importa considerar que as eleições presidenciais em França não se limitam à designação do titular da chefia de Estado, como acontece em Portugal. O presidente francês é também o chefe do Governo. Por isso, a pesada derrota do candidato socialista exprime também a deceção e o profundo desagrado dos eleitores com o Governo de François Hollande que, prevendo uma avaliação francamente negativa da sua governação, nem sequer ousou recandidatar-se. Por isso mesmo, caso se venha a confirmar a vitória esperada sobre Marine Le Pen, a 7 de maio, subsiste uma grave incógnita que só terá resposta depois das eleições legislativas de junho: que forças políticas estarão representadas na próxima Assembleia Nacional? Qual será o respetivo peso político? Como irá Macron governar a França sem um partido que suporte o seu programa de Governo? Que maioria conseguirá congregar em torno das suas propostas que, como sabemos, mereceram a preferência de apenas 23% dos eleitores?
Macron foi ministro da Economia do Governo socialista de Hollande e demitiu-se em virtude da forte contestação que suscitou. Por isso criou um movimento - En Marche - para se candidatar agora como independente e distanciar-se da sombra do Governo atual. Entre as políticas que Macron aplicou no Governo de Hollande, as reformas estruturais que a troika e o Governo PSD/CDS nos impuseram ao longo dos negros anos do resgate financeiro e o programa de reformas económicas que Macron agora apresenta, não encontramos nenhuma diferença substancial. Por outro lado, em matéria de política internacional, sabemos que aprovou a exibição de violência gratuita de Donald Trump sobre o território sírio e ficou indiferente à violação do Direito Internacional. Chegamos assim à conclusão fruste de que o contributo da vitória de Macron para a mudança de rumo de que a Europa está tão carecida será muito modesto e sempre a reboque de atores mais fortes, como a Alemanha, ou mais ousados, como o Governo de António Costa.
Os demónios libertados pelas vitórias do Brexit e de Trump não conseguiram até agora contaminar o continente europeu. Esperemos que as eleições alemãs possam transportar sinais mais prometedores. Entretanto, acreditamos que Macron vai conseguir esconjurar, a 7 de maio, o pesadelo fascista de Marine Le Pen.
DEPUTADO E PROFESSOR DE DIREITO CONSTITUCIONAL