Mário Soares nasceu a 7 de dezembro de 1924. A República iria sucumbir um ano e meio mais tarde, às mãos de um golpe de Estado militar apoiado pelas forças mais reacionárias do país. Em 1946, com apenas 18 anos, o jovem Mário Soares aderiu ao Movimento de Unidade Nacional Anti-Fascista e, três anos depois, fundava a secção juvenil do Movimento de Unidade Democrática. Em 1949, apoiou a candidatura de Norton de Matos à Presidência da República e, em 1958, bateu-se pela eleição de Humberto Delgado que iria ser esmagado nas urnas por uma gigantesca fraude eleitoral orquestrada pelo ditador Oliveira Salazar. Além de professor, foi um advogado comprometido na defesa de presos políticos e representou a família de Humberto Delgado - assassinado pela PIDE em 13 de fevereiro de 1965. Por 12 vezes foi preso pela Polícia política, julgado por "delito de opinião", desterrado para São Tomé, sem julgamento, e depois exilado em França. Assim trabalhavam as leis do "Estado Novo" e assim murchou a "Primavera marcelista".
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Em 1973, Mário Soares fundou na Alemanha o Partido Socialista, de que foi o primeiro secretário-geral. Com a Revolução de Abril de 1974, regressou a Portugal para assumir a delicada tarefa de reabilitar perante a comunidade internacional um país isolado do Mundo por mais de quatro décadas de um autoritarismo rústico e trauliteiro, desprezado pela obstinação numa guerra injusta e absurda. Enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros nos Governos Provisórios, Mário Soares vai assegurar o reconhecimento internacional do novo regime político e abrir por fim o processo de descolonização, encetando as negociações com os movimentos de libertação. Em 1976, com a vitória do PS nas primeiras eleições legislativas realizadas após a aprovação da nova Constituição democrática, Mário Soares foi nomeado primeiro-ministro do I Governo Constitucional e seria ele a dar início às negociações do processo de adesão à "Comunidade Económica Europeia" e, de novo, em junho de 1985, a assinar o Tratado de Adesão. A integração na Europa era peça central da estratégia de consolidação do regime democrático e, sobretudo, o novo horizonte - cosmopolita e solidário - ambicionado para uma pátria que encerrou, a destempo, um longo e tortuoso ciclo imperial.
Em 1986, Mário Soares iria tornar-se o primeiro Presidente civil eleito por sufrágio universal, na história da República e concretizar, em dois mandatos consecutivos, o seu entendimento de uma presidência republicana, laica, civilista, respeitadora da instituição parlamentar, atenta à governação, aberta à sociedade e ao Mundo. Quando, em março de 1996, cessou as funções de mais alto magistrado da República, Mário Soares não abandonou o combate porque, em democracia, a ação política não cabe na definição mesquinha de uma qualquer "carreira profissional". Com lucidez e desassombro persiste na denúncia dos erros e perversões que hoje ameaçam as causas cívicas a que dedicou toda a sua vida: a liberdade, a democracia, o projeto europeu.
A decisão de encerramento dos Estaleiros de Viana do Castelo, a extinção da empresa e o despedimento dos 609 trabalhadores, são o exemplo flagrante da incompetência, insensibilidade e irremediável desorientação de um Governo sem visão, sem estratégia de desenvolvimento para o país, sem vergonha. A Câmara Municipal aprovou por unanimidade - incluindo os vereadores dos partidos da coligação de Governo - uma moção de repúdio da decisão governamental, a exigência da suspensão do processo e, sob o lema - "a construção naval não pode morrer" - promoveu uma manifestação de solidariedade com os trabalhadores, em Viana do Castelo, na tarde de sábado passado. Solidário com os trabalhadores dos estaleiros, Mário Soares quis responder ao apelo lançado pelo Município e ali compareceu, precisamente, no dia em que completou 89 anos. A vida do Doutor Mário Soares marca dois séculos de história da luta pela liberdade, a paz, a justiça e a democracia. Não basta agradecer o seu contributo generoso: há que seguir o seu exemplo de tolerância, de solidariedade, de coragem e audácia. Muitos parabéns, Dr. Mário Soares!