1 Para não variar e porque até parece que já tardava, reacendeu-se a violência entre israelitas e palestinos. Desta feita, três jovens foram a "causa" do reacender deste rastilho trágico. Três jovens israelitas. Foram raptados e a seguir executados friamente, crê-se que por elementos ligados ao Hamas. Como seria de esperar, este ato cobarde comoveu Israel, e comoveu fora de Israel. Logo a seguir, num ato também ele cobarde e de represália, um jovem palestino foi raptado e queimado vivo. Morreu.
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Tudo se acelerou. Seguiram-se tumultos em Jerusalém, em algumas cidades israelitas com presença significativa de palestinianos, e uma intervenção policial-militar musculada de Israel na Faixa de Gaza, tendo em vista deter centenas de militantes do Hamas. A partir deste ponto, só falaram as armas. O Hamas, que não consigo deixar de considerar uma organização terrorista, porque o terror é uma das suas ferramentas fundamentais, começou a lançar rockets contra Israel (e já vamos em mais de quinhentos). E Israel iniciou bombardeamentos contra posições do Hamas e alvos aparentemente legítimos à luz do direito dos conflitos armados.
Mas não chegava. E os bombardeamentos têm-se intensificado. Feitas as contas, e por ora, mais de cem mortos e centenas de feridos do lado palestiniano.
Afinal, é tudo normal. É normal que, no século XXI, se continue a aplicar a Lei de Talião, do século XVIII... antes de Cristo. É normal o "olho por olho, dente por dente". Mas, no que se refere às relações entre israelitas e palestinianos, esta "normalidade" (se assim me atrevo a chamar-lhe) vai muito mais longe, porque a vingança recíproca é sempre desproporcional. O Hamas, esse, vai aproveitando, porque este protagonismo lhe convém. A famosa "Primavera Árabe", que nunca existiu, teve enquanto processo ao menos uma vantagem: secaram várias das fontes de financiamento daquela organização, agora com menos capacidade de matar.
Mas Israel, outra vez para não variar, não sai incólume de mais este episódio, ainda em curso. Porque Israel não consegue parar a tempo. E o "a tempo", no que a esta questão se refere, significa a incapacidade israelita de não ir além da defesa legítima dos seus. Em ter que ir mais longe. Em aplicar uma Lei de Talião ao quadrado ou ao cubo, numa voragem em que o passado está sempre presente, e o presente é sempre uma repetição monótona e sangrenta do passado.
2Pelos lados de França, uma notícia incomum, quase extraordinária. Em 1948, milhares de mineiros na região do Nord-Pas-de-Calais iniciaram uma greve para protestarem contra vários decretos que estabeleciam uma redução dos seus salários. Depois de dois meses de greve, com confrontos violentos com a polícia, vieram as consequências, duras. Mais de 3000 foram despedidos. Várias centenas foram julgados, e alguns condenados a penas de prisão. O que é que o episódio tem de especial? Primeiro, a greve foi em 1948, ano da independência de Israel. Depois, foi aprovada uma lei de amnistia em 1981, o que permitiu que aqueles que tinham sido despedidos por terem feito greve pudessem, eventualmente, vir a ser indemnizados.
Mas ainda era preciso esperar. Foi preciso esperar por 2011, altura em que o Tribunal de Recurso de Versalhes condenou a entidade pública que geria as minas e decidira os despedimentos a pagar 30 mil euros a 17 dos mineiros sobreviventes. Esta decisão foi revertida, em outubro de 2012, pela Cour de Cassation (o equivalente ao nosso Supremo).
Lá está: sessenta e quatro anos depois, uma injustiça flagrante ia vencer.
Ia? Não ia. Porque nos conta agora o "Le Monde" que a ministra da Justiça francesa enviou uma carta ao Ministério das Finanças a solicitar-lhe que pague as indemnizações devidas aos mineiros que ainda estão vivos ou, não estando, aos seus herdeiros.
Assim, 66 anos depois, e daquelas centenas de grevistas condenados pela Injustiça, já só podem reclamar a indemnização agora prometida pouco mais de trinta (contando já com os herdeiros). Andam para lá dos 90 anos de idade. E admiro-os muito. Porque nunca desistiram, e conseguiram que o seu passado fosse reparado. A reparação, é verdade, é pouco mais do que simbólica. Mas houve reparação, contra tudo e quase todos.