<p>Sejamos francos: a discussão em torno das verbas para a Madeira passou completamente ao lado do que é o normal entendimento das coisas por parte do chamado grande público. Acusações de mentira usadas de parte a parte apenas confirmam o que era perceptível: alguém manobrava os números, alguém torcia a verdade. Maior dificuldade de entendimento para o cidadão comum porque não é vulgar ver o BE ou o PCP baterem-se pelos interesses de Alberto João Jardim. </p>
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Haverá, certamente, em todo o Orçamento um qualquer artigo onde estarão inscritos 50 milhões de euros mal gastos. Os destinados à Madeira são apenas uma questão de princípio, e só por isso se encontra algo de verosímil numa discussão totalmente afastada das pessoas e dos seus interesses mais imediatos. É por isso que a única coisa boa deste espectáculo mau foi poder ver um ministro a emergir do que parecia ser um autismo generalizado. Recusando ceder na questão das verbas para a Madeira, o ministro disse as únicas coisas que toda a gente genericamente entende: "Não podemos dar um sinal mais errado neste momento" - disse ele para justificar a recusa. E também: "Não faz sentido que as Regiões Autónomas, em particular a Madeira, vejam alargadas as condições para se endividarem ainda mais". Aposto, singelo contra dobrado, que esta argumentação foi completamente entendida por muita gente em Bragança, Portalegre ou Beja, o interior de um país que não consegue discriminações positivas que sustentem a sua interioridade e que são, agora, chamadas a ser solidárias com uma Região que já vive acima da média nacional.
Prova isto, afinal, que o acordo conseguido para a aprovação do Orçamento não é suficiente para que o país saia paulatinamente da crise que atravessa. Como aqui mesmo já disse, Cavaco Silva vai ter de exercer a sua influência junto dos partidos para que estes vejam um pouco mais longe do que a mera mercearia eleitoral que permitiu evitar o recurso a eleições. Não é tarefa fácil para um presidente em fim de mandato, que verá todos os seus passos analisados pelo prisma de quem estará a fazer caminho para se recandidatar. E não é tarefa fácil sobretudo porque os seus interlocutores - os partidos - estão, como se viu neste caso das verbas para as Regiões, mais interessados em exibir-se no jogo maioria-minoria, num braço-de-ferro constante. Como, há dias, alguém dizia, em tempo de crise, sobram-nos políticos e faltam estadistas.
P. S. - José Sócrates foi posto novamente no olho do furacão. O plano que lhe é atribuído pode ser uma enorme mentira, a sua divulgação uma irresponsabilidade e uma enorme ilegalidade. Mas Sócrates já não pode fugir a isso tudo. Sócrates foi eleito e tem direito a governar, mas a verdade é que, sem perder legitimidade, vai perdendo condições.