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Gradual ou de forma intensa? O primeiro-ministro usou ambas as caracterizações para colocar uma pedra sobre o vaguear da data a partir da qual milhões de portugueses - funcionários públicos e pensionistas - recuperarão a posse dos subsídios de férias e de Natal. Conhece-se todo o folhetim: a suspensão tinha cunho provisório até 2013, depois passou para 2014 e, por fim, 2015 é a data anunciada para regressar um Estado de bem, isto é, capaz de não atropelar regras e inscrições constitucionais. Com a tal cambiante, entre o gradual e a forma intensa....
Até ao próximo desdizer ficaram ontem os portugueses mais descansados: se Passos Coelho não desmentir o ministro das Finanças, a palavra será cumprida. Em 2015, se o Mundo não acabar e os astros ajudarem a conjuntura económica nacional e internacional, voltarão o 13.oº e o 14.o meses. De modo faseado, às pinguinhas de 25%. E não é preciso ser macroeconomista para se perceber: os funcionários públicos e os reformados que ainda forem vivos receberão as duas mensalidades integrais em 2018. Haja fé......
Pelo sim pelo não, existe uma bússola orientadora, também ela geradora de ruído semântico. Enquanto o Partido Socialista a adjetiva de PEC - Programa de Estabilidade e Crescimento -, para o qual não foi tido nem achado, numa reposição do célebre PEC IV prenunciador do derrube do Governo de Sócrates, o atual Poder dá-lhe outro nome: DEO - Documento de Estratégia Orçamental. Muito diferente? No seu ar professoral, o ministro Vítor Gaspar deu ontem uma lição eloquente: "O DEO inclui toda a substância que estaria incluída no PEC, mas o conteúdo político está já contido no programa de ajustamento" a que o país está obrigado. Estamos, enfim, elucidados. Embora para Bruxelas haja parâmetros a impor e tudo o resto não passe de música celestial.
Tratando-se de PEC ou de DEO há, apesar de tudo, um elemento nada negligente: o documento não foi alvo de qualquer atitude cortês da parte do Governo para com o principal partido da Oposição, por sinal primeiro subscritor da aceitação do documento salvífico da bancarrota esquematizado pela troika há um ano. E não obstante estar o Partido Socialista a tentar encontrar um posicionamento, nada fácil, de recuperação de credibilidade, mandaria algum bom senso que a coligação governamental PSD-PP não esticasse tanto a corda...
Assim como assim, o país não ganha nada em deitar fora uma das razões para a credibilidade no projeto de recuperação sob os holofotes da comunidade internacional: o apoio de largo espetro político-social.
Apesar de o DEO - ou PEC? - prenunciar a retoma já no próximo ano e de Vítor Gaspar abrir uma janela de esperança segundo a qual em 2016 "se prevê que a atividade económica tenha já atingido o seu nível potencial", convirá não desbaratar os bons modos e a articulação mínima entre todas as partes do tripé de apoio.