<p>Ao compulsar-se o PEC 2010-2013, percebe-se que não estamos perante um projecto radical e original. Na verdade, o plano de estabilização e crescimento não é radical, na medida em que não vai até ao fim, na lógica de muitas medidas. E não é original, porque, previsivelmente, segue receitas conhecidas para a ultrapassagem de uma crise grave, continuada e profunda. </p>
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Esta aproximação tem virtudes e defeitos. Por um lado, privilegia a abundância de fontes de rendimento e contenção (o tal "mal repartido pelas aldeias"). Por outro, podia ter sido mais ambicioso, específico, visionário, em áreas onde age superficialmente: é o caso das privatizações (decididas com que critério?), da poupança nas administrações públicas (central, regional, local), das "despesas com consumo intermédio" (um tradicional alçapão de desperdício), do sector empresarial do Estado (nas suas carteiras principal e acessória, que valem 14,5 mil milhões de euros) e do largo universo de institutos e serviços públicos (que só agora se começa a disciplinar).
O PEC diz "privilegiar a redução e contenção da despesa". Mas nem toda a despesa pública é perversa, exagerada ou redutível.
O documento aposta ainda nas "reformas estruturais" pela modernização e contra o endividamento, mas prova pouco sobre a real dimensão dessas mudanças. O plano preza a "estabilidade fiscal" e a "sustentabilidade orçamental", mas falha em reconhecer que "estabilidade" não é sempre "justiça", e que "sustentabilidade" precisa de significar algo mais do que três fugazes anos.
Críticos de sectores muito diversos zurzem o PEC pelo seu ataque aos rendimentos do trabalho, aos réditos e sobrevivência das classes médias, mal compensado pela proclamada taxa de 45% para os ordenados maiores, pelo agravamento das mais-valias imobiliárias, e pela redução de benefícios fiscais de grandes empresas. A "estabilidade fiscal" age sobre classes sociais já proletarizadas, ou a esse caminho, em vez de as aliviar.
Por outro lado, a "sustentabilidade" pós-2013 está mal vislumbrada, nas suas bases e raízes. Pode temer-se que, depois dessa meta, os problemas regressem, com mais gravidade. E o que se ganha, até lá, pode ser minúsculo.
Claro que, sem reformas, a dívida podia atingir 100% do PIB.
O purgatório é sempre melhor que o inferno. Mas a política deve almejar ao céu.