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Sempre que estou no Porto penso na hipótese de ter uma casinha com vista para a faina do Douro. Gosto de quase tudo. Do povo da Ribeira, da burguesia da Foz, dos cafés dos pobres onde ainda sou capaz de encontrar sandes de molho, e dos scones dos ricos da Marechal Gomes da Costa. Gosto da história da cidade, da sua força liberal, da independência e feroz liberdade, da coragem, claro. Não a do "agarra-me senão eu mato-te", mas a bravura a sério, a camisola que se tira da pele para se dar a quem precisa, o engenho de terem inventado as tripas para que as caravelas pudessem enfrentar o desconhecido. Sempre que saio do Porto, quero regressar. E no domingo, ao ver o Manuel e o Pedro, um a perder e o outro a ganhar, mais convencido fiquei. Da parte de Manuel Pizarro, um sorriso de tristeza num discurso impecável. Da parte de Pedro Duarte, uma necessidade de estender a ponte aos que perderam, de abraçar o amigo socialista numa hora difícil. O Porto é diferente. E foi-o na noite eleitoral. Dois cavalheiros que provaram que a política também pode ser feita assim. Sem que o sangue prevaleça no fim da batalha, sem uma ponta de ressentimento. Pizarro perdeu pela terceira vez, julgo que deve parar. Pedro Duarte ganhou à primeira vez, julgo que não ficará por aqui. Há no sucessor de Rui Moreira qualquer coisa de anacrónico. É um jovem antigo, um progressista conservador, um tímido empático. Um tipo a quem poderia comprar um carro em segunda mão. Ou beber um copo e falar da vida. Não é pouco, para começar.