As vacinas não são apenas uma questão de saúde. Valem dinheiro. Muito dinheiro. E podem ser usadas como um relevante instrumento geopolítico, como se percebe em alguns requisitos fixados por certos países para os respetivos passaportes de vacinação. Neste contexto, o levantamento das patentes revela-se uma chave miraculosa para nos salvar.
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A proposta foi feita pela África do Sul e pela Índia junto da Organização Mundial do Comércio e ganhou escala quando os Estados Unidos manifestaram apoio à suspensão da licença de patentes das vacinas. Será mais um sinal da mudança de políticas protagonizada por Joe Biden, mas também se impõe dizer que os EUA, nesta altura bem-sucedidos na vacinação, perceberam já que não haverá nenhum país vencedor enquanto o vírus circular livremente.
As reações a este anúncio foram céleres. A Organização Mundial da Saúde congratulou-se com essa possibilidade; a Federação Internacional de Fabricantes e Associações Farmacêuticas considerou-a uma "resposta errada" para um problema complexo, defendendo que essa renúncia "não vai aumentar a produção nem fornecer soluções práticas" para combater o SARS-CoV2; a Comissão Europeia apenas disse que pondera debater a questão...
Nesta altura, muitos medem forças políticas, outros fazem contas. Depois do anúncio dos EUA, as ações das grandes produtoras das vacinas baixaram de imediato: as ações da Moderna e da Novavax fecharam em queda, entre 3% e 6%, na Bolsa de Nova Iorque; as da BioNTech cotadas em Frankfurt perderam 14%.
Para quem olha para as vacinas concentrado na saúde não terá dificuldades em ver no levantamento das patentes uma fórmula eficaz de combater problemas de fabrico e, consequentemente, de administração de doses. O Mundo não é todo igual relativamente ao acesso a vacinas, sendo gritante o desequilíbrio atual registado no continente africano ao nível da população vacinada.
Ora, para além do gravíssimo problema humanitário que isso desenha, há ainda o risco das variantes e a possibilidade de novas vagas à escala planetária. Para minimizar esses perigos, há que vacinar todos rapidamente e em força. Tornar as licenças das vacinas um bem público não revela generosidade, implica salvaguardar o futuro da Humanidade. Como lembrou o presidente do Conselho Europeu numa entrevista conjunta a alguns jornalistas portugueses, "a bússola não pode ser o PIB, tem de ser o bem-estar dos cidadãos". Falava da Europa, mas poderia falar do Mundo.
*Prof. associada com agregação da UMinho