O Brexit dominou a agenda, suspensos dos dramas pouco shakespearianos que se desenrolaram no Parlamento britânico. Os dados estavam lançados e não houve novidade, mas o caos instalado e a profunda divisão da sociedade são uma tragédia à procura de autor que encontre solução para as peripécias. Desta vez, a fleuma esteve do lado de cá do canal, com os parceiros europeus alinhados na resposta ao Reino Unido, mantendo a porta aberta, mas atentos ao espetáculo sem fim à vista.
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O Governo português tem acompanhado de forma próxima o desenrolar do processo, em particular a situação da comunidade portuguesa e o risco para as empresas exportadoras. Várias medidas estão em curso nesta corrida contra um tempo ainda desconhecido. A mais antiga aliança do Mundo não nos deixa descansados, embora olhar a história próxima e longa ajude a compreender a encruzilhada em que estamos. Não é preciso regressar à Guerra dos Cem Anos (1337-1453), que começou com as pretensões de Inglaterra à coroa francesa e se tornou num conflito que atravessou gerações e deixou marcas duradouras. Recordemos os anos 60 em que o presidente francês Charles de Gaulle vetou por duas vezes a entrada do Reino Unido na CEE, argumentando que "a natureza, a estrutura, a conjuntura, que são próprias de Inglaterra, diferem dos países continentais". Desconfiava das relações especiais entre o Reino Unido e os EUA que os ingleses sempre colocariam acima da CEE. Nos últimos anos, foram sobretudo os jovens que mudaram esta visão e entenderam as vantagens para as suas vidas de integrarem a União Europeia e beneficiarem do seu potencial. Mas não tenhamos ilusões.
O tempo corre depressa e sem memória. Nesta agitação contemporânea, ontem é um passado longínquo. Não vivemos sequer o tempo dos jornais diários, mas o segundo do tweet que muda a perspetiva das coisas, e muda mesmo, nesta ânsia de informação pouco refletida. Esquecemos que o ócio significava tempo para pensar, enquanto hoje condenamos quem estiver parado e não participe na rapidez de acontecer. Perdemos a ligação entre gerações. Que importa quem vem depois?
Neste inverno friorento, é boa altura para ler o neurocientista Lamberto Maffei, que acaba de publicar "Elogio da palavra", final da trilogia iniciada com "Elogio da rebelião" e "Elogio da lentidão". Neste último, Maffei reflete sobre o valor do pensamento lento e explica como pensar devagar permite agir depressa.
*Professora universitária
