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O meu filho mais velho prefere as artes performativas às artes desportivas. Por isso, ao contrário de muitos dos meus colegas aqui do JN, não sou obrigado a levantar-me com as galinhas, sobretudo ao fim de semana, para o levar aos sítios onde a equipa joga (há dias, o colega aqui do lado teve de ir com o filho, num domingo, à Lousã...), ou a levá-lo e a ir buscá-lo aos treinos. O meu filho mais novo prefere as artes desportivas às artes performativas, pelo que, um destes dias, este bulício vai passar a ocupar a minha agenda e a roubar-me horas de descanso.
Este esforço dos pais que conheço tem outras cambiantes. Apenas um exemplo fresquinho: na Académica de S. Mamede, em Matosinhos, onde 3 mil crianças e jovens praticam voleibol, os pais, os jogadores e os treinadores andam a pintar a expensas próprias a fachada do pavilhão onde treinam. Por esse país fora, no voleibol como em muitas outras modalidades, coisas como esta acontecem às centenas, senão aos milhares.
Portugal nunca teve uma verdadeira cultura e uma verdadeira educação desportivas. Por isso, é profundamente ridículo ouvir (e ler) lamentos e críticas severas à prestação dos nossos atletas nos Jogos Olímpicos. Todos gostaríamos de ouvir o hino português várias vezes tocado em Londres, mas, em bom rigor, pedir que tal aconteça não passa da expressão de um desejo que se concretiza muito esporadicamente (Michael Phelps, o nadador norte-americano, conseguiu, só por si, tantas medalhas - 22 - como Portugal em todas as suas participações nas olimpíadas).
Apesar das muitas melhorias introduzidas no desporto escolar (o meu professor de Educação Física era professor... de Filosofia, e tudo o que sabia era mandar-nos correr à volta do campo e jogar futebol), agora limitadas pela visão moderníssima do ministro Crato (a partir deste ano letivo a Educação Física deixa de contar para a média final do aluno), a verdade é que a performance desportiva de Portugal, nas mais variadas áreas e descontando as exceções que confirmam a regra, é apenas o reflexo do país.
Pertencer a uma elite mundial, seja ela qual for, não se faz com um estalido, ou apelando aos deuses, ou esperando que a sorte nos empurre para o sucesso. Pertencer a uma elite mundial, seja ela qual for, exige a definição de um caminho e a alocação de recursos para o trilhar. E, acima de tudo, exige que os indivíduos postos nesse trilho se entreguem de alma e coração à empreitada, sofrendo muitas vezes, chorando muitas mais, aprendendo a perder para mais tarde vencer.
O país que não percebe isto está condenado à deriva. Os puros que cospem comentários contra a falta de medalhas dos nosso atletas são apenas a expressão maior do português pequenino que gosta de armar em grandalhão.